Antes das 4 horas
Aqui (Posto de Comando do Movimento das Forças Armadas. As Forças Armadas Portuguesas apelam para todos os habitantes da cidade de Lisboa no sentido de recolherem a suas casas nas quais se devem conservar com a máxima calma. Esperamos sinceramente que a gravidade da hora que vivemos não seja tristemente assinalada por qualquer acidente pessoal para o que apelamos para o bom senso dos comandos das forças militarizadas no sentido de serem evitados quaisquer confrontos com as Forças Armadas. Tal confronto, além de desnecessário, só poderá conduzir a sérios prejuízos individuais que enlutariam e criariam divisões entre os portugueses, o que há que evitar a todo o custo.
Não obstante a expressa preocupação de não fazer correr a mínima gota de sangue de qualquer português, apelamos para o espírito cívico e profissional da classe médica esperando a sua ocorrência aos hospitais, a fim de prestar a sua eventual colaboração que se deseja,sinceramente,desnecessária.
Às 4,45 horas
A todos os elementos das forças militarizadas e policiais o comando do Movimento das Forças Armadas aconselha a máxima prudência, a fim de serem evitados quaisquer recontros perigosos.
Não há intenção deliberada de fazer correr sangue desnecessariamente, mas tal acontecerá caso alguma provocação se venha a verificar.
Apelamos para que regressem imediatamente aos seus quartéis, aguardando as ordens que lhes serão dadas pelo Movimento das Forças Armadas.
Serão severamente responsabilizados todos os comandos que tentarem, por qualquer forma, conduzir os seus subordinados à luta com as Forças Armadas.
Apelo às forças militarizadas
Aqui Posto de Comando das Forças Armadas. Informa-se a população de que, no sentido de evitar todo e qualquer incidente, ainda que involuntário, deverá recolher às suas casas, mantendo absoluta calma.
A todos os componentes das forças militarizadas, nomeadamente às forças da G. N. R., P. S. P. e ainda às forças da ID. G. S. e da Legião Portuguesa, que abusivamente foram recrutadas, lembra-se o seu dever cívico de contribuírem para a manutenção da ordem pública, o que na presente situação só poderá ser alcançado se não for oposta qualquer reacção às Forças Armadas. Tal reacção nada teria de vantajoso pois apenas conduziria a um indesejável derramamento de sangue que em nada contribuiria para a união de todos os portugueses.
Embora estando crentes no civismo e no bom senso de todos os portugueses no sentido de evitarem todo e qualquer recontro armado, apelamos para que os médicos e pessoal de enfermagem se apresentem aos hospitais para uma colaboração que fazemos votos por que seja desnecessária.
Às 5 horas
Atenção elementos das forças militarizadas e policiais. Uma vez que as Forças Armadas decidiram tomar a seu cargo a presente situação será considerado delito grave qualquer oposição das forças militarizadas e policiais às unidades militares que cercam a cidade de Lisboa.
A não obediência a este aviso poderá provocar um inútil derramamento de sangue cuja responsabilidade lhes será inteiramente atribuída.
Deverá por conseguinte, conservar-se dentro dos seus quartéis até receberem ordens do Movimento das Forças Armadas.
Os comandos das forças militarizadas e policiais serão severamente responsabilizados caso incitem os seus subordinados à luta armada.
Às 7,30 horas
Conforme tem sido difundido, as Forças Armadas desencadearam na madrugada de hoje uma série de acções com vista à libertação do País do regime que há longo tempo o domina.
Nos seus comunicados as Forças Armadas têm apelado para a não intervenção das forças policiais com o objectivo de se evitar derramamento de sangue. Embora este desejo se mantenha firme, não se hesitará em responder, decidida e implacavelmente, a qualquer oposição que venha a manifestar-se.
Consciente de que interpreta os verdadeiros sentimentos da Nação, o Movimento das Forças Armadas prosseguirá na sua acção libertadora e pede à população que se mantenha calma e que se recolha às suas residências. Viva Portugal!
As 10,30 horas
O Posto de Comando do Movimento das Forças Armadas constata que a população civil não está a respeitar o apelo já efectuado várias vezes para que se mantenha em casa.
Pede-se mais uma vez à população que permaneça nas suas casas a fim de não pôr em perigo a sua própria integridade física. Em breve será radiodifundido um comunicado esclarecendo o domínio da situação.
Às 11,45 horas
Na sequência das acções desencadeadas na madrugada de hoje, com o objectivo de derrubar o regime que há longo tempo oprime o País, as Forças Armadas informam que de Norte a Sul dominam a situação e que em breve chegará a hora da libertação.
Recomenda-se de novo à população que se mantenha calma e nas suas residências para evitar incidentes desagradáveis cuja responsabilidade caberá integralmente às poucas forças que se opõem ao Movimento.
Chama-se a atenção de todos os estabelecimentos comerciais de que devem encerrar imediatamente as suas portas, colaborando desta forma com o Movimento, de modo a evitar açambarcamentos desnecessários e inúteis.
Caso esta determinação não seja acatada, será forçoso decretar o recolher obrigatório. Ciente de que interpreta fielmente os verdadeiros sentimentos da Nação, o Movimento das Forças Armadas prosseguirá inabalavelmente na missão que a sua consciência de portugueses e militares lhes impõe. Viva Portugal!
Às 13 horas
O Movimento dias Forças Armadas informa as famílias de todos os seus elementos que eles se encontram bem e que tudo decorre dentro do previsto.
Pretendendo continuar a informar o Pais sobre o desenrolar dos acontecimentos históricos que se estão processando, o Movimento das Forças Armadas comunica que as operações, iniciadas na madrugada de hoje, se desenrolam de acordo com as previsões, encontrando-se dominados vários objectivos importantes, de entre os quais se citam os seguintes:
- Comando da Legião Portuguesa;
- Emissora Nacional;
- Rádio Clube Português;
- Radiotelevisão Portuguesa;
- Rádio Marconi;
- Banco de Portugal;
- Quartel-General da R. M. de Lisboa;
- Quartel-General da R. M. do Porto;
- Instalações do Quartel – Mestre – General;
- Ministério do Exército, donde o respectivo ministro se pôs em fuga;
- Aeroporto da Portela;
- Aeródromo Base n.º l;
- Manutenção Militar;
- Posto de Televisão de Tróia;
- Penitenciária do Forte de Peniche.
Sua Ex.ª o almirante Américo Tomás, Sua Ex.ª o Prof. Marcelo Caetano e os membros do Governo encontram-se cercados por forças do movimento no quartel da Guarda Nacional Republicana, no Carmo, e no Regimento de Lanceiros 2 tendo já sido apresentado um ultimato para a sua rendição.
O Movimento domina a situação em todo o País e recomenda, uma vez mais, que toda a população se mantenha calma. Renova-se também a indicação já difundida para encerramento imediato dos estabelecimentos comerciais, de forma a não ser forçoso o decretar do recolher obrigatório. Viva Portugal!
Às 15 horas
O Movimento das Forças Armadas, tendo conhecimento de que elementos da Guarda Nacional Republicana se fazem passar por elementos amigos avisa de que tais elementos são adversos, pelo que aconselha a população a abandonar o Largo do Carmo, o Rossio e o Camões.
Às 17,30 horas
O Movimento das Forças Armadas têm ocupados os estúdios da R. T. P. em Lisboa e no Porto, embora no centro emissor de Monsanto se registe uma interferência provocada por forças da reacção, que, a todo o momento serão dominadas. Logo de seguida, a Radiotelevisão Portuguesa entrará ao serviço do Movimento das Forças Armadas e do Pais,noticiando os seus comunicados.
Às 18,20 horas
Aqui posto de comando das Forças Armadas. Em aditamento ao último comunicado, o Movimento das Forças Armadas informa a Nação que conseguiu forçar a entrada no quartel da Guarda Nacional Republicana, situado no Largo do Carmo, onde se encontrava o ex. – Presidente do Conselho e outros membros do seu ex. – Governo.
O Regimento de Lanceiros 2, onde se recolheram outros elementos do seu ex. -Governo, entregou-se ao Movimento das Forças Armadas, sem que houvesse necessidade do emprego da força que os cercava.
A quase totalidade da Guarda Nacional Republicana, incluindo o seu comando e a maioria dos elementos da Polícia de Segurança Pública, já se rendeu ao Movimento das Forças Armadas.
O M. F. A. agradece à população civil todo o carinho e apoio que tem prestado aos seus soldados, insistindo na necessidade de ser mantido o seu valor cívico ao mais alto grau. Solicita também que se mantenha nas suas residências durante a noite, a fim de não perturbar a consolidação das operações em curso, prevendo-se que possa retomar as suas actividades normais amanhã, dia 26. Viva Portugal!
Às 19,50 horas
Posto de contando do Movimento das Forças Armadas.
Continuando a dar cumprimento à sua obrigação de manter o País ao corrente do desenrolar dos acontecimentos, o Movimento das Forças Armadas informa que se concretizou a queda do Governo, tendo Sua Ex.ª o Prof. Marcelo Caetano apresentado a sua rendição incondicional a Sua Ex.ª o general António de Spínola. O ex-presidente do Conselho, o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e o ex-ministro do Interior encontram-se sob custódia do Movimento, enquanto Sua Ex.ª o almirante Américo Tomás e alguns ex-ministros do Governo se encontram refugiados em dois aquartelam entoa que estão cercados pelas nossas tropas e cuja rendição se aguarda para breve.
O Movimento das Forças Armadas agradece a toda a população o civismo e a colaboração demonstrados de maneira inequívoca desde o início dos acontecimentos, prova evidente de que ele era o intérprete do pensamento e dos anseios nacionais.
Continua a recomendar-se a maior calma e a estrita obediência a todas as indicações que forem transmitidas. Espera-se que amanhã a vida possa retomar o seu ritmo normal, para que todos, em perfeita união, consigamos construir um futuro melhor para o País. Viva Portugal!
Às 21 horas
Aqui posto de comando do Movimento das Forças Armadas. Segundo comunicação telefónica aqui recebida cerca das 20.30, ter-se-iam verificado incidentes na Rua António Maria Cardoso, onde se situa a sede da D. G. S.
No decorrer desses incidentes, foram feridas algumas pessoas, encontrando-se já no local assistência médica. Aguarda-se a todo o momento a intervenção das Forças Armadas. Estes incidentes vêm mais uma vez confirmar a necessidade de a população civil cumprir o pedido formulado pelo M. F. A., recolhendo às suas residências e mantendo a calma.
Para conhecimento de toda a população informa-se que se encontram sanados os incidentes ocorridos com a Polícia de Segurança Publica e que, a partir deste momento, ela aderiu totalmente ao movimento. Assim com a finalidade de manter a ordem e salvaguardar as vidas e os bens, pede-se a todos que aceitem, obediente e prontamente, quaisquer indicações que lhes sejam transmitidas por elementos daquela corporação ou da Polícia Militar. Igualmente deverão ser obedecidos os agentes das Brigadas de Trânsito. Torna-se indispensável que a população continue a manifestar a sua compreensão e civismo. E a melhor forma de o fazer no momento é manter-se calmamente nas suas residências.
AS RAZÕES DO MOVIMENTO (COMUNICADO DO M. F. A. - 25/4/74) Considerando que ao fim de 13 anos de luta em terras do Ultramar, o sistema político vigente não conseguiu definirem concreta e objectivamente uma política ultramarina que conduza à Paz entre os Portugueses de todas as raças e credos.
Considerando o crescente clima de total afastamento dos Portugueses em relação às responsabilidades políticas que lhes cabem como cidadãos em crescente desenvolvimento de uma tutela de que resulta constante apelo a deveres com paralela denegação de direitos;
Considerando a necessidade de sanear as instituições, eliminando do nosso sistema de vida todas as ilegitimidades que o abuso do poder tem vindo a legalizar.
Considerando, finalmente, que o dever das Forças Armadas é a defesa do País como tal se entendendo também a liberdade cívica dos seus cidadãos, o Movimento das Forças Armadas, que acaba de cumprir com êxito a mais importante das missões cívicas dos últimos anos da nossa História, proclama à Nação a sua intenção de levar a cabo, até à sua completa realização, um programa de salvação do País e da restituição ao Povo Português das liberdades cívicas de que tem sido privado.
Para o efeito entrega o Governo a uma Junta de Salvação Nacional a que exige o compromisso com as linhas gerais do programa do Movimento das Forças Armadas, que através dos órgãos informativos será dado a conhecer à Nação, no mais curto prazo consentido pela necessidade de adequação das nossas estruturas, promover eleições gerais de uma Assembleia Nacional Constituinte, cujos poderes pôr sua representatividade e liberdade na eleição permitam ao País escolher livremente a sua forma de vida social e política.
Certos de que a Nação está connosco e que, atentos aos fins que nos presidem, aceitará de bom grado o Governo Militar que terá de vigorar nesta fase de transição, o Movimento das Forças Armadas apela para a calma e civismo de todos os portugueses e espera do País adesão aos poderes instituídos em seu benefício.
Saberemos deste modo honrar o passado no respeito pêlos pelos compromissos assumidos perante o País e por este perante terceiros. E ficamos na plena consciência de haver cumprido o dever sagrado (Já da restituição ia à Nação dos seus legítimos e legais poderes.
PROCLAMAÇÃO AO PAÍS LIDA POR SPÍNOLA (26/4/74)
Em obediência ao mandato que acaba de lhes ser confiado pelas Forças Armadas, após o triunfo do Movimento em boa hora levado a cabo pela sobrevivência nacional e pelo bem-estar do Povo Português, a Junta de Salvação Nacional, a que presido, constituída por imperativo de assegurar a ordem e de dirigir o País para a definição e consecução de verdadeiros objectivos nacionais, assume perante o mesmo o compromisso de:
- Garantir a sobrevivência da Nação, como Pátria Soberana no seu todo pluricontinental;
- Promover, desde já, a consciencialização dos Portugueses, permitindo plena expressão a todas as correntes de opinião, em ordem a acelerar a constituição das associações cívicas que hão-de polarizar tendências e facilitar a livre eleição, por sufrágio directo, de uma Assembleia Nacional Constituinte e a sequente eleição do Presidente da República;
- Garantir a liberdade de expressão epensamento;
-Abster-se de qualquer atitude política que possa condicionar a liberdade da eleição e a tarefa da futura Assembleia Constituinte e evitar por todos os meios que outras forças possam interferir no processo que se deseja eminentemente nacional;
- Pautar a sua acção pelas normas elementares da moral e da justiça, assegurando a cada cidadão os direitos fundamentais estatuídos em declarações universais e fazer respeitar a paz cívica, limitando o exercício da autoridade à garantia da liberdade dos cidadãos;
- Respeitar os compromissos internacionais decorrentes dos tratados celebrados;
- Dinamizar as suas tarefas em ordem em que no mais curto prazo o País venha a governar-se por instituições de sua livre escolha;
- Devolver o poder às instituições constitucionais logo que o Presidente da República eleito entre no exercício das suas funções.
A JUNTA ADVERTE (3/5/74)
Embora a Junta de Salvação Nacional se sinta reconhecida pelo exuberante apoio dado ao Movimento das Forças Armadas pelo Povo Português, pêlos pelos movimentos políticos e sindicatos, comunica ao País que não pode consentir, nem consentirá, que a sua autoridade – garante da defesa dos sãos princípios democráticos - seja afectada por procedimentos não previamente sancionados pelo Poder que assumiu e exerce.
Enquanto não for constituído o Governo provisório, compete aos Departamentos oficiais vigentes continuar a dirigir a vida da Nação e a regular as actividades públicas e privadas, sendo considerados actos de insubordinação e crimes contra o Movimento das Forças Armadas, e, como tal, vigorosamente reprimidas, investigadas e julgadas todas as interferências de pessoas, grupos e instituições na condução que só ao poder constituído compete. Toda e qualquer colaboração, bem como sugestões de medidas de saneamento a tomar deverão ser oferecidas e apresentadas aos delegados da Junta de Salvação Nacional junto dos respectivos departamentos, aos quais cumpre tomar as decisões que as circunstâncias aconselharem.
Procedimento contrário, embora por vezes bem intencionado, compromete os fins da real democratização e liberalização que inspirou o Movimento das Forças Armadas, podendo afectar a confiança que no mesmo deposita a Nação e conduzir ao sistema totalitário que o País quer definitivamente abatido.
A Junta de Salvação Nacional está crente que todos os portugueses verdadeiramente conscientes e bem formados reconhecem que não se podem pôr em prática de um dia para o outro as medidas que se impõe tomar, e que só progressivamente na ordem e na disciplina se poderá garantir ao País as liberdades fundamentais.
SPÍNOLA É PROCLAMADO PRESIDENTE DA REPÚBLICA (15/5/74)
PROCLAMAÇÃO
De harmonia com a decisão da Junta de Salvação Nacional que assumiu a direcção dos destinos da Nação, a partir do dia 25 de Abril último, tenho a honra de proclamar Presidente da República o general António de Spínola que exercerá as suas funções com os poderes semelhantes aos previstos na actual Constituição até às eleições gerais a realizar dentro de um ano.
PALAVRAS PROFERIDAS PELO GENERAL COSTA GOMES
SENHOR PRESIDENTE DA REPUBLICA:
Os jovens do Movimento das Forças Armadas realizaram em 25 de Abril a mais digna Revolução da História Contemporânea.
A Junta de Salvação Nacional, por eles escolhida, em acto de inspiração e justiça elegeu V. Ex.ª para representante maior do Povo de Portugal.
As minhas palavras não adicionarão um átomo à sua estatura profissional de soldado ou ao seu perfil de político e homem de letras.
Recordamo-lo como capitão empreendedor que restabeleceu a Revista de Cavalaria e a dirigiu durante tantos anos.
Vemo-lo consagrado no Norte de Angola como chefe militar, tão ousado e valoroso que o adversário o considerava invulnerável às balas.
Reconhecemo-lo no Sul, em tarefas de promoção social, apóstolo da paz nas relações com Cuanhamas e Cuamatos.
Encontramo-lo na Guiné tão sereno frente ao perigo como humano na acção governativa; do irmão Spínola falam os Guinéus que o veneram.
A culminar uma longa bibliografia poli facetada, surge na plenitude do seu talento político – literário o Livro da esperança nacional que foi o idearia da Revolução das Cravos.
Que Deus o proteja para Bem do Povo e glória de Portugal.
DISCURSO DE ANTÓNIO DE SPÍNOLA
Portugueses: Ao ser investido nas funções de Presidente da República por decisão da Junta de Salvação Nacional, sinto-me no dever de me vincular ao idearia do Movimento das Forças Armadas, à luz do qual se cumprirá a tarefa de construção do futuro e por cuja execução assumo, perante o País, o mais solene compromisso.
São para as Forças Armadas as minhas primeiras palavras. Vilipendiadas pelas atitudes servis de alguns dos seus chefes, injustamente acusadas dos erros dos políticos, violentadas a coberto do seu elevado sentido da honra e do dever, quase destruídas, em suma, no que representavam de instituição eminentemente nacional, as Forças Armadas, pela mão dos seus quadros mais jovens, souberam apesar de tudo mobilizar a sua última reserva moral colocando-se ao serviço da Nação, de que há décadas haviam sido desviadas.
A Pátria deve a hora grandiosa que hoje vive a esses jovens que souberam manter acesa a chama do dever, e que, na nobreza do seu idealismo, arrastaram com eles à vitória o Povo Português. Na consciência de que a plenitude da soberania pertence à Nação, cabendo às Forças Armadas a sua instante defesa, o Movimento das Forças Armadas, em rasgo de serena audácia e perfeita isenção, restituiu Portugal ao seu Povo. Jamais os Portugueses poderão esquecer o verdadeiro alcance da gesta libertadora destes magníficos militares que salvaram o País da tragédia nacional para que se caminhava. Devemos ao seu patriotismo e ao seu sentido do dever como servidores do Povo sem partidarismos, o momento histórico que a Nação vive. E por mais eloquentes que sejam as palavras, só a História e os vindouros saberão julgar toda a extensão e incomensurável serviço prestado à Pátria e ao Povo Português do Movimento das Forças Armadas.
Vividas as primeiras semanas de natural explosão emotiva, pontuada todavia por alguns excessos lesivos do clima de tranquilidade cívica cuja firme salvaguarda se impõe, o País vai entrar numa fase de reflectida ponderação, iluminada pelo reconhecimento de que democracia não significa anarquia, e de que a confusão dispersiva de actuações descoordenadas não ajuda, de modo algum, a construção do futuro que o Povo Português anseia.
O desrespeito pela ordem social decorrente de uma sólida fundamentação democrática e do perfeito funcionamento de instituições representativas, foi sempre, em todos os tempos e latitudes, a porta por onde entraram os ditadores. Bem gostaríamos de a ter encerrado definitivamente; mas só o conseguiremos quando cada português impuser a si próprio, em livre expressão da sua capacidade para o exercício da cidadania, o mais alto padrão de disciplina cívica, sem o qual jamais poderá edificar-se uma autêntica democracia.
Impõe-se-nos, antes de mais, fazer um profundo exame de consciência, para concluir se será, de facto, democrático o processo esboçado de decidir e aplicar decisões fraccionárias antes de o Povo definir, em consenso, o tipo de sociedade em que deseja viver. E que a democracia e o governo do povo, pelo povo e para o povo, não podendo entender-se senão na mais inteira liberdade de expressão, associação, reunião, debate e votação das decisões colectivas pela via de instituições legítimas, logo seguida da mais estrita observância das decisões assim tomadas. Creio firmemente ser essa a única forma de vida política onde cabe a dignidade humana; de resto, foi em nome desse ideal cívico que as Forças Armadas libertaram o País.
A democracia não se conquista; talvez mesmo se não construa; a democracia vive-se. E, assim, o nosso propósito não pode ser outro senão o lançamento de bases sólidas para essa vivência; propósito aliás claramente expresso no programa do Movimento das Forças Armadas que vale a pena evocar nos seus traços essenciais.
Reitero por isso o programa traçado, tendente a promover a estruturação partidária e associativa em clima da mais completa abertura, devendo o poder instituído assegurar que as liberdades de uns não sejam ameaçadas por excessos de outros. Empenhar-nos-emos em evitar, por todos os meios, que o processo de politização dos cidadãos possa ser entravado ou comprometido, constituindo ponto firme do nosso programa o desmantelamento do aparelho repressivo do antigo regime. Mas os caminhos que o País haverá de trilhar terão de ser definidos por instituições democráticas verdadeiramente representativas e solidamente implantadas, através das quais todos os cidadãos possam exprimir-se, onde todas as correntes de opinião se façam ouvir e em cujo topo se encontre, em lírica expressão final da soberania, uma Câmara Legislativa constituída por mandatários incontestáveis do Povo português. Serão as decisões dessa Câmara, depois de referendadas, que definirão o nosso estatuto político, económico e social. E só então nascerá, de facto, o Portugal renovado que ambicionamos.
Entretanto, os nossos esforços centrar-se-ão no restabelecimento da paz no Ultramar; mas o destino do Ultramar português terá de ser democraticamente decidido por todos os que àquela terra chamam sua. Haverá que deixar-lhes inteira liberdade de decisão; e em África, como aqui, evitaremos por todas as formas que a força de minorias, sejam elas quais forem, possa afectar o livre desenvolvimento do processo democrático em curso.
Nesta linha de pensamento, desejamos firmemente, em plena corporização dos ideais do Movimento triunfante, que a paz volte ao Ultramar. E pensamos que o regresso dos partidos africanos de emancipação ao quadro da actividade política livremente desenvolvida será a prova cabal do seu idealismo e o mais útil contributo para o pleno esclarecimento e a perfeita consciencialização dos povos africanos, em ordem a uma opção final conscientemente promovida e escrupulosamente respeitada.
Na ordem interna, empenhar-nos-emos em tornar representativas as organizações políticas, sociais e económicas, reparar injustiças sociais e cívicas, recuperar valores e assegurar o justo equilíbrio nas relações de trabalho.
Para tanto, haverá que acelerar o ritmo de expansão económica; garantir, dentro dos sãos princípios da ordem democrática, a completa liberdade sindical dos trabalhadores e do patronato; desmantelar o antigo controlo corporativo e aniquilar os seus estrangulamentos; criar um clima propício à constituição de partidos e associações político-económicas que exprimam todas as correntes de opinião; promover a livre eleição da nova Assembleia Constituinte; sujeitar a referendo a Lei Fundamental que definirá o estatuto de livre escolha do Povo Português; e finalmente entregar o Poder às novas instituições livremente constituídas e como tal perfeitamente legitimadas.
É evidente que terá de proceder-se, em paralelo, ao saneamento moral do País e à reformulação de todo um complexo de conceitos de justiça social, delineando as bases em que irá moldar-se o perfil da nova sociedade portuguesa.
Na ordem externa, manteremos os nossos compromissos de natureza política, económica e militar, para os quais não há, de momento, outras razões limitativas senão as claramente decorrentes do circunstancialismo do momento que vivemos e da salvaguarda de riscos imediatos.
Entendo não dever ir mais longe nas minhas afirmações, pois a partir de amanhã o País terá à sua frente um Governo Provisório a quem será entregue a prossecução das tarefas que hão-de corporizar o ideal proclamado. Na verdade, se o Movimento das Forças Armadas libertou o Pais dos que agiam em seu nome mas sem mandato, não faria sentido que, ao ultrapassar o quadro traçado, voltássemos afinal ao mesmo sistema de decisões unilateralmente tomadas, embora sob outro rótulo e pela mão de outros poderes.
Nem se argumente que tais tarefas seriam legitimadas pela vontade do Povo expressa nas gigantescas demonstrações cívicas a que o País assistiu. Será bom recordar que os ditadores começaram sempre reformando à margem das instituições sob o eufórico aplauso popular. Foi aliás essa forma demagógica de transformar o Poder em tirania com o apoio das massas em delírio que esteve sempre na origem dos regimes totalitários. Ao contrário, o propósito que nos anima é o de criar a defender instituições democráticas estáveis, na serenidade de espírito com que devem tomar-se as decisões por que há-de reger-se um povo.
Competirão, portanto, ao Governo Provisório as tarefas administrativas necessárias à vida quotidiana que não pode parar, e a ingente missão de, a par da construção do bem-estar económico e social, edificar e consolidar a democracia através da qual o Povo Português encontrará a autêntica liberdade.
Terá de ser, assim, um Governo sem partidos, porque é de todos os partidos; sem tendências, porque nele cabem todas as tendências; sem programas, porque o seu programa é o do Movimento das Forças Armadas. É nesse sentido de eminência nacional que se enquadra; e a essa luz governará a Nação até que esta tenha ultimado quanto carece para governar-se a si própria, no pleno exercício da soberania que enfim se lhe devolve.
A realização desta gigantesca tarefa de preparação e de recuperação do País tem necessariamente de basear-se na estabilidade social e na expansão económica, impondo-nos serenidade cívica e a obrigação moral de uma total entrega ao trabalho intenso em todos os sectores da vida nacional.
Não podemos, de forma alguma, deixar que pressões de qualquer ordem venham perturbar o nosso processo de evolução; e à imagem do Portugal Renovado que estamos construindo teremos de associar a afirmação de plena capacidade para evoluir politicamente sem convulsão social nem quebra do ritmo da formação de riqueza que a todos aproveite. Daí justificar-se, mais do que nunca, o apelo ao trabalho no sentido de um aumento de produtividade, sendo esta, de momento, a mais instante das reivindicações; apelo, por isso, à consciência colectiva do operoso Povo Português que por certo não desejará a sua libertação ensombrada pelo espectro desolador de uma crise económica com todo o cortejo de privações e sob o signo do desemprego.
E tão-pouco será em clima de ódio cego e de obstinação vingativa sobre os responsáveis dos males passados que construiremos a imagem que há-de restituir-nos, perante o mundo, o lugar que nos cabe no contexto das Nações. Para tanto, impõe-se que sejamos coerentes e se entregue à isenção da Justiça o apuramento de responsabilidades pelos crimes e iniquidades cometidos à sombra do velho regime. E bem desejaria que, nesta hora de arranque para uma nova ordem, esse apelo à coerência encontrasse eco no espírito de todos os Portugueses, pois o Movimento das Forças Armadas triunfou para que as decisões arbitrárias e os anteriores métodos de repressão fossem banidos da vida nacional, e não para que houvesse apenas simples mudança de executores.
São estes os traços gerais da missão em que me empenharei durante o mandato que o Movimento das Forças Armadas me confiou. Tomo perante o Povo Português a responsabilidade do seu integral cumprimento; e faço-o de consciência tranquila, pois jamais a vida política se me revelou aliciante. Servirei o País com a mesma santa devoção com que sempre o servi, como soldado que me orgulho de ser; e desejo por isso concluir, com a afirmação de que a minha presença neste lugar deverá ser por todos entendida, antes de tudo e apenas, como firme e cabal garantia de que não serão traídas as esperanças despertas nos corações portugueses na manhã de 25 de Abril. Cumprida essa missão, e entregue o testemunho ao Presidente da República que o País livremente escolher, recolherei de novo ao seio das Forças Armadas de que nunca me afastei, e onde irei reintegrar-me com a consciência de ter cumprido o meu dever.
GALVÃO DE MELO ESTÁ ATENTO (INTERVENÇÃO NA RTP -27/5/74)
Com data de 22 de Maio, recebi uma carta que, embora dirigida à Junta de Salvação Nacional, vinha ao meu cuidado. Escrita por um só português, poderia ter sido escrita por todos os portugueses autênticos. Vale a pena torná-la conhecida. Por isso aqui estou. Ora escutai:
«À Junta de Salvação Nacional:
Aderi, desde a primeira hora, ao Movimento das Forças Armadas e ao programa da Junta de Salvação Nacional.
Não represento ninguém, senão eu próprio, mas, passadas quatro semanas sobre o 25 de Abril, começo a perguntar, e não obtenho resposta, se isto será a LIBERDADE que o Povo Português sonhava:
- Isto que é libertarem-se terroristas sem Pátria e transformá-los em heróis nacionais!
– Isto que é permitir-se e fomentar-se a «caça ao homem», o insulto gratuito, as ofensas corporais, saque de casas!
– Isto que é boicote de alguns, criado nas estações oficiais de rádio e televisão, com noticiários vergonhosos e impunemente parciais, em que os próprios locutores se permitem as atitudes mais impróprias, e nos martelam com programas e reportagens de nível baixo de todos os limites, não permitindo pôr a claro as meias verdades e as mentiras propagadas nas emissões que são pagas por todos nós; e tudo isto sem que nenhum locutor ainda tenha sido suspenso, como já teria acontecido em qualquer país civilizado!
– Isto que é permitir-se a ignóbil transcrição, em jornais que estão ao alcance de qualquer criança, do comunicado das prostitutas e dos homossexuais, numa demonstração de amoralidade sem precedentes em qualquer país em que a Família e a Moral existem ainda como valores!
– Isto tudo será a liberdade?
A resposta a isto tudo começam a dar os jornais estrangeiros, e bem insuspeitos, que já troçam e nos apontam como a Democracia Carnavalesca.
Em consciência, portanto, não podia deixar de me dirigir à Junta de Salvação Nacional e manifestar as minhas enormes apreensões pelo clima de anarquia que se vive e respira a todos os níveis e que está em total desacordo com a Liberdade responsável que o Movimento das Forças Armadas veio trazer aos portugueses da metrópole e do ultramar.
Por último, pergunto:
- Poderá o País aguentar a crise económica que dia a dia se vai desenhando diante de todos, com a paralisação da indústria e do comércio, com o aumento do desemprego, como consequência da falência inevitável de pequenas e médias empresas que soçobram perante exigências demagógicas de oportunistas, que se dizem representar o trabalhador honesto, o qual, na sua boa-fé, assim se deixa enganar por gente sem escrúpulos?
Que Deus guarde Portugal!»
Aqui termina a carta que foi escrita por um só português e poderia ter sido escrita por todos os portugueses autênticos que nesta hora me escutam.
Não vou comentar, em detalhe, a carta que acabei de vos ler: concordo com o autor nas suas preocupações fundamentais, e tanto me basta.
Portugueses:
No Mundo, existe um valor: o Homem.
Neste Homem devemos entender todos os homens: o ministro, que noite dentro cogita preocupado sobre o que será melhor para o povo que nele confia; e o cavador, que, de sol a sol, fecunda a terra com o esforço dos seus braços robustos. Ambos são dignos do nosso respeito e do nosso agradecimento... quando ambos cumprem até ao limite das capacidades com que os dotou a Natureza ou ulterior circunstância de acaso.
Foi para este Homem – para estes dois homens – que certa juventude militar, amadurecida no drama africano, se levantou cedo na madrugada de 25 de Abril e, unânime e decidida, abriu de par em par as portas da liberdade ao homem português:
- A liberdade de pensar e se instruir;
- A liberdade de criar ideias próprias e as discutir com o seu igual, o homem da cidade e o homem do campo, para, ambos, encontrarem a melhor ideia e a mais digna;
- A liberdade de todos os Portugueses escolher o que melhor for para todos os Portugueses.
É esta – e não outra - a Liberdade que a Junta de Salvação Nacional tomou a seu cargo respeitar e defender. É esta – e não outra – a Liberdade que a juventude heróica dos capitães depositou nas mãos experimentadas dos generais.
Estamos atentos, também nós, provavelmente antes de quaisquer outros, e breve nos demos conta do mau uso que se vem fazendo da Liberdade oferecida ao povo de Portugal, vai decorrido um mês.
É verdade que muita coisa nos desgosta, e quase espanta a ingratidão que é tão maltratar aquilo que com tanta emoção e dignidade foi oferecido!
Mas, talvez, o que se vê e ouve, tão contrário ao bem comum por que todos ansiávamos, seja apenas o gesticular grotesco, o vozear desafinado, de uns poucos que nunca pegaram na enxada para cavar o pão que comem por excesso ou jamais puderam conceber idades que mereçam a pena ouvir sem que no-las gritassem.
Também há os que nada querem senão o mal...
Teremos de os ensinar, usando de certa paciência e da firmeza necessária.
Porém – e é esta a nossa grande esperança e veemente desejo -, pode ser que o que se vê e ouve, tão contrário ao bem comum por que antes todos ansiávamos, não seja outra coisa que o despertar tumultuoso de um povo inocente que ousa os primeiros passos num caminho seu desconhecido: o longo e difícil caminho da Liberdade.
Esteja atento, mas tranquilo, o autor da carta; estejam atentos, mas tranquilos todos os Portugueses.
As Forças Armadas cometeram-se a missão de libertar o povo de Portugal.
Podem ficar com a certeza de que cumpriremos!
Somos homens de fé. Não abdicamos da causa começada.
SPÍNOLA NO PORTO (29/5/74)
É com profunda emoção que comungo do vosso contagiante entusiasmo. Não ides ouvir um discurso formal do Chefe de Estado mas apenas a voz de um Português verdadeiramente amante da sua Pátria, um Português como vós galvanizado pelo comum anseio de construir um Portugal Novo.
Um Portugal democrático, verdadeiramente livre e com mais justiça social. Um Portugal onde todos os Portugueses possam viver uma vida mais digna e mais feliz.
Mas esse Portugal livre por que todos ansiamos terá de ser edificado sob o signo da paz, da justiça e do trabalho.
Sem paz nos campos, nas fábricas, nas ruas e nos espíritos, sem o esforço conjunto de todos os Portugueses em ordem a aumentar a produtividade do trabalho, e sem justiça social traduzida numa equitativa distribuição do produto desse trabalho, jamais será possível construir o Portugal próspero do futuro – um Portugal onde a felicidade e o bem-estar não sejam apenas privilégio de alguns mas entrem livremente em todas as casas.
No dia 25 de Abril, as Forças Armadas restituíram a liberdade ao Povo Português. A partir de então acabaram os paternalismos de «elites» equívocas e o Povo pode expressar livremente, em diálogo aberto, os seus legítimos anseios.
Mas passado o primeiro mês de eufórico entusiasmo, é tempo de todos os Portugueses reflectirem que uma sociedade livre e democrática não é possível sem disciplina cívica e respeito mútuo. Para que a bandeira da Pátria seja efectivamente o símbolo da liberdade do seu povo, cada cidadão tem de respeitar a liberdade dos seus concidadãos, pois só num clima de recíproco respeito, na disciplina e na ordem poderemos consolidar a liberdade que as Forças Armadas nos ofereceram.
É tempo de cada Português meditar profundamente nos caminhos que pode tomar a partir de agora: o caminho da salvação do País ou o da sua ruína.
É tempo de todo o Português concluir por si mesmo que qualquer forma de anarquia acabará fatalmente por abrir a porta a novas ditaduras.
Daqui alerto todos os Portugueses de que as ideias democráticas e de liberdade que inspiraram o Movimento das Forças Armadas estão sendo sub-repticiamente minadas por forças contra-revolucionárias. Forças que se situam em diversos sectores da Nação e visam unicamente a destruição, a anarquia, o caos económico, o desemprego, na concretização prática da conhecida teoria da «terra queimada», para sobre a ruína económica e moral da Nação e utilizando como argamassa a nossa carne e o nosso sangue, construir algo de alheio ao País que todos sonhamos.
Eis a primeira grande opção que o Povo Português tem de fazer: a liberdade democrática ou o anarquismo. É chegada a altura de consolidar e reforçar a união do Povo com as Forças Armadas, combatendo em comum os inimigos da liberdade e da democracia, que pretendem por todas as formas opor-se ao rápido progresso económico do País – única via de nos anteciparmos à grave crise de desemprego e miséria para que criminosamente nos querem encaminhar as forcas da contra-revolução. E desejo reforçar este apelo à consciência do Povo Português com a garantia de que as Forças Armadas não deixarão trair a pureza dos princípios democráticos que inspiraram o Movimento de 25 de Abril; e se alguma vez forem obrigadas a responder à violência com a força fá-lo-ão sem hesitações, agora com a reforçada e legitimada autoridade de quem age em defesa da autêntica liberdade do Povo Português.
SPÍNOLA EM COIMBRA (31/5/74)
Foi com viva emoção que escutei as palavras de saudação do presidente da comissão administrativa da Câmara Municipal desta velha mas sempre jovem cidade de Coimbra. Palavras que calaram fundo no coração de um português, que, como qualquer de vós, partilha da mesma legítima aspiração a um Portugal livre e democrático.
É, portanto, como cidadão que me dirijo ao povo de Coimbra, cidade tão antiga como a Pátria. Povo que nasceu, vive e trabalha à sombra de pedras impregnadas de tradição de história. Povo cujo espírito se caldeou em clima de constante evocação dos grandes liberais aqui formados que rasgaram novos horizontes ao mundo do conhecimento. Povo orgulhoso da sua Universidade – pólo de irradiação cultural e ao mesmo tempo centro de ideias criadoras, que sempre situaram Coimbra em posição de vanguarda no pensamento e na acção.
Por isso a gente conimbricense foi sempre aberta a ideários progressistas, a que não é alheio o permanente convívio com os jovens intelectuais que hospeda, lídimos representantes daquela juventude saudavelmente irrequieta que com generosidade e entusiasmo alimenta o progresso das nações.
Foi neste clima de síntese do passado e do futuro, e neste ambiente misto de tradição e de modernidade, que a cidade de Coimbra se transformou num centro de difusão de cultura e em notável pólo vanguardista do desenvolvimento social e político da Nação.
Deverá ser essa a razão por que os conimbricenses tão bem souberam entender o espírito liberal que inspirou o Movimento das Forças Armadas.
E termino na segura convicção de que Coimbra saberá consolidar na ordem a liberdade conquistada, construir no trabalho produtivo a prosperidade da sua gente e da sua terra. Saberá também compreender que para reivindicar é preciso primeiro edificar, e que não poderá distribuir-se riqueza sem primeiro a produzir. Saberá, enfim, o povo de Coimbra fazer uso da liberdade que lhe foi restituída, liberdade que se encontra na mais profunda tradição desta cidade, em cujas Cortes aprendeu a não abdicar dos seus direitos, com a legitimidade de quem respeita voluntariamente o pacto social a que aderiu.
E ao agradecer-vos esta recepção, não posso deixar de manifestar o conforto que levo da certeza de que o povo de Coimbra saberá manter bem vivo o espírito do Portugal Novo nascido na madrugada de 25 de Abril – um Portugal democrático, verdadeiramente livre e com mais justiça social.
Viva Portugal!
SPÍNOLA DÁ POSSE AO CONSELHO DE ESTADO (31/5/74)
Acabam VV. Ex. as de ser empossados nas funções de Conselheiros de Estado, completando-se com este acto a estrutura política que presidirá ao País até à definição da nova lei fundamental.
Compõem o Conselho de Estado os membros da Junta de Salvação Nacional, alguns elementos preponderantes do Movimento das Forças Armadas e sete cidadãos de alta capacidade crítica e reconhecido esclarecimento. Não se me afigura necessário referir aqui as responsabilidades que sobre VV. Ex. as impendem, pois a sua dimensão encontra-se claramente expressa no diploma constitucional que delimita as funções deste órgão. Bastará apenas sublinhar que o âmbito das tarefas a que serão solicitados se situa no mais alto nível entre os mandatários da Nação, tendo-lhes sido atribuída competência que situa o Conselho de Estado na cúpula do presente quadro institucional.
Cumpre-nos, essencialmente, reconstruir uma Nação devolvida a si própria, o que exige uma total mobilização de capacidades e, acima de tudo, a mais constante e absoluta coerência com os princípios e objectivos do regime democrático que nos propusemos instituir.
Temos de reconhecer que uma Nação governada há meio século à margem da participação efectiva do povo constitui presa fácil de oportunismos políticos, sempre atentos a qualquer clivagem por onde possam infiltrar-se. E nunca será de mais denunciar quanto essas manobras são contrárias ao interesse geral, pois apenas visam através do caos obter o mando. Jamais interessou aos oportunistas o bem-estar dos povos; sempre se aliaram a quem pudesse facilitar-lhes o acesso ao poder mediante uma simples mudança de mão, aproveitando em seu benefício exclusivo todo o enfraquecimento da autoridade.
Tal risco agudiza-se entre nós pelas possibilidades da contra-revolução se infiltrar nos mais bem intencionados movimentos, desvirtuando-os e levando-os a exceder os limites do razoável e do possível, a promover a desordem cívica e por essa via operar o regresso ao passado que firmemente desejamos banir.
Não cabem nos sãos princípios democráticos imposições de vontade que não resultem de lei expressa, nem é democrática a intimidação de minorias nem a vida das sociedades à margem das leis. É neste contexto que se revela imperioso o reconhecimento de um poder moderador, que sendo de todos não se enfeude a ninguém e cujo papel é o de assegurar a protecção dos mais fracos contra a violação das suas consciências. É esse o poder que vos compete assumir. Teremos pois de empenhar-nos, por todos os meios, em ajudar os Portugueses a tomar imediata consciência de que a liberdade é, acima de tudo, o primado da lei em cuja feitura todos participam, jamais sendo possível na ausência da lei, e muito menos ainda quando entendida como a faculdade de cada um ditar a sua própria lei.
Para tanto, haverá que institucionalizar os partidos políticos como formas de expressão decorrentes do pensamento e da vontade da Nação. Mas seria bom que os partidos políticos fossem concebidos mais como associações de opinião do que como organizações enquadrantes de cidadãos espartilhados por políticas partidárias demasiado rígidas. E se as concepções totalitárias do Estado assentam sempre em partidos únicos, rigidamente estruturados, não fará sentido que os Portugueses celebrem a sua libertação sem atentar no risco de fundamentos menos reflectidos, acabando, nessa eventualidade, por aderir a organizações em tudo similares às que estiveram na origem de um regime cujo regresso nos negamos terminantemente a aceitar.
É tempo de cada português saber distinguir entre programas políticos autênticos e amontoados de bem orquestrados «slogans» demagógicos. Queremos, de facto, um País novo, cujos cidadãos se orgulhem de pertencer a uma sociedade aberta, constituída por seres pensantes, livres, capazes de debater em diálogo os problemas da sua comunidade, desde a família até ao conjunto da Nação.
Mas para que tal debate não redunde em factor de desagregação, impõe-se combater eficazmente todo o desvio da linha dos superiores interesses do País, neste caso traduzida na implantação de um regime democrático. De outra forma, estaríamos traindo as Forças Armadas e o próprio Povo, denegando à partida toda a possibilidade de construir o País que queremos ser.
Não creio, senhores conselheiros, que na presente conjuntura possa ser outro o quadro conceitual em que teremos de nos inserir. E porque do actual esquema político do País se irá passar para o regime que o Povo dentro de um ano referendar, a constituição do Conselho de Estado marca um patamar no processo de entrega de responsabilidades às instituições a quem foi dada a incumbência de preparar a reconversão nacional.
Termina, assim, a fase do pronunciamento militar com o retorno ao clima de legítima institucional idade que a Moral e o Direito impõem. E bem podem as Forças Armadas, ao completar a tarefa a que se comprometeram, sentir-se orgulhosas de haverem cumprido o seu dever. Dever que lhes impõe aturada vigilância e absoluta isenção, no respeito pelos princípios consagrados da ética militar, à luz dos quais lhes compete defender o País e o bem-estar dos seus cidadãos, sem, todavia, deter em seu nome o Poder senão pelo prazo indispensável à consolidação da ordem civil.
Nunca será de mais afirmar a dívida que gratidão da Pátria para com esses bravos obreiros do Movimento de 25 de Abril. B no momento «m que a sua tarefa se conclui, cumpre-me expressar o apreço da Nação por quantos souberam situar acima de pressões e conformismos os superiores interesses da grei.
Eis, senhores conselheiros, o enquadramento geral da alta missão que sem desfalecimentos nos compete cumprir, proporcionando ao País o desenvolvimento de um processo democrático, pautado no respeito pela vontade soberana do povo português.
Resta-me formular os mais sinceros votos pelo êxito da tarefa a que metemos ombros, e que se completará quando, dentro de um ano, pudermos passar de consciência tranquila o testemunho que o Movimento das Forças Armadas nos transmitiu.
SPÍNOLA EM TOMAR (3/6/74)
Discurso do Presidente da República, general António de Spínola em Tomar, em 3 de Junho de 1974:
Bom Povo de Tomar. Vivo convosco esta hora grande de entusiasmo, a hora de encontro com um Portugal renovado, a hora da democracia, da liberdade e da justiça social. Como primeiro servidor de uma nova sociedade portuguesa, já legitimada pela inequívoca adesão à liberdade que lhe foi restituída, cumpre-me o indeclinável dever de vos acautelar contra todos aqueles que, directa ou indirectamente, estão empenhados em minar o ideário democrático que presidiu ao Movimento das Forças Armadas.
Estamos a iniciar os primeiros passos no caminho da democratização, da justiça social, do trabalho e da paz. Mas haverá que distinguir, desde já, a verdadeira democracia das ideologias que, a coberto de um falso conceito de liberdade, nos podem conduzir a regimes políticos bem mais despóticos do que o derrubado em 25 de Abril.
É bom que o Povo Português se não deixe iludir pela jovem embriaguez dos vivos à liberdade e à democracia, que muitas vezes cria um ambiente propício à entrada da contra-revolução. Passado o clima emocional dos primeiros momentos, é chegada a hora de tomada da consciência colectiva do Povo Português. Pelo recolhimento da sua intimidade deverá reflectir friamente sobre a realidade económica do País em que vive sob a pena de caminhar para uma crise de desemprego com todo o seu dramático cortejo de privações e de misérias. É bom, portanto, que o Povo Português se não deixe atordoar pela liberdade que lhe foi devolvida, porque, se tal suceder, cedo ou tarde, outros lha virão roubar.
A verdadeira liberdade não consente intimidações ou violência para sermos livres, para concordar ou discordar, mas ninguém pode ser livre para violentar a consciência do seu semelhante. Queremos de facto um País livre, digno e ordeiro e não uma absurda democracia que nos leve ao caos. Queremos um Portugal próspero, prestigiado e ocupando o seu verdadeiro lugar no mundo. Aqui mesmo em Tomar o povo desta terra algumas vezes disse corajosamente «não» aos reis de Portugal. Mas hoje chegou o momento de o povo de Tomar dizer «não», desta vez àqueles que procuram sabotar o processo de democratização em curso. Temos de nos habituar a consolidar a liberdade conquistada. Escutemos, analisando, observando, criticando construtivamente, formando opiniões, mas acautelando-nos das manobras dos oportunistas, buscando se são viáveis as promessas falsas aliciantes ou se, pelo contrário, não passam de meros processos demagógicos utilizados para fins inconfessados.
A ambição humana, a ambição do poder é de todos os tempos e a consciência política dos cidadãos deve levar-nos a saber distinguir se outras correntes em presença, as que servem verdadeiramente o povo e os que apenas desejam servir-se dele para alcançar posições de mando.
É esta a consciência política que a pouco e pouco se impõe tomar. E ao sentir o calor do vosso acolhimento mais se me radica no espírito a convicção de que o Povo Português saberá escolher por si o que lhe serve repudiando a palavra vazia dos falsos arautos da liberdade. Bem hajam por esta hora alta de clara afirmação da indestrutível vontade de um povo que deseja conseguir a paz e sobretudo uma nação livre e digna.
SPÍNOLA NA OTA (10/6/74)
Força Aérea, aqui representada em todos os escalões e nas pessoas hoje condecoradas.
Não será formal o Presidente da República falar numa cerimónia deste tipo. Efectivamente não vos fala o Presidente da República. Fala-vos o militar, o soldado, o combatente. E nesta hora histórica e crítica que o País vive, reivindico, para além das funções que exerço, a minha qualidade de combatente. Foi, portanto, com viva emoção que ouvi as palavras que antecederam esta cerimónia: e não foi também sem profunda emoção que acabo de condecorar viúvas e filhos de camaradas, e, entre os vivos, os heróis hoje aqui consagrados.
As palavras que ouviram do representante do Movimento das Forças Armadas foram bem elucidativas. As Forças Armadas responderam, na manhã do dia 25 de Abril, aos políticos que as não souberam compreender, e que à sua sombra estavam conduzindo o País à desagregação e ao caos.
Não é altura de recordar o passado, no qual as Forças Armadas foram as grandes vítimas de uma política deficientemente orientada, ou melhor preconcebidamente orientada, no sentido do seu desprestígio, fazendo-as assumir as responsabilidades que não lhes cabiam. Por isso, bem-haja os jovens oficiais a que se ficou devendo o movimento de 25 de Abril. O movimento que, se por um lado libertou o País, restituindo-lhe a legitimidade do poder político, por outro, veio fazer justiça às Forças Armadas.
Hoje, o País vive uma nova era. Estamos no início da construção dum Portugal novo. A nós, Forças Armadas, compete-nos permanecer vigilantes, atentos, para que o passado não volte e para que jamais alguém tenha a veleidade de novamente nos imolar em benefício de interesses políticos
Em todos os tempos, nas horas críticas, a Pátria sempre se encontrou naqueles que o povo elegeu como sendo os melhores – os homens de carácter, os valentes, os bravos. Estamos presentemente, empregando todos os nossos esforços para que a paz volte ao Ultramar. Mas estes anos de guerra tiveram um mérito: revelar de entre todos os melhores, sempre tão necessários nos momentos difíceis da vida das pátrias.
Era isto que aqui vos queria dizer, nesta hora confusa, nesta hora mista em que a tradição competia com o autêntico patriotismo. Nesta hora histórica, hora em que se abrem amplos horizontes a uma vida melhor para a nossa Pátria, mas em que é preciso falar bem claro para que não sejam traídos os legítimos anseios do bom povo português, em que se inspirou o Movimento das Forças Armadas ao longo de treze anos de luta no Ultramar. Longo período em que mais do que a retaguarda, mais do que alguns daqueles que arvoram dísticos e fazem manifestações, elas foram a grande vítima.
É esta a palavra de gratidão que a Pátria deve às Forças Armadas nesta hora, e é esta palavra de gratidão que neste momento, para além do militar, do soldado, do combatente que sou, o Presidente da República aqui vos veio trazer.»
SPÍNOLA EM TANCOS (2/8/74)
Conhecemo-nos bem. Estão aqui presentes muitos oficiais, sargentos e soldados pára-quedistas que me conhecem das horas boas e das horas más, das horas de construção do progresso das terras do ultramar e das horas em que à guerra tivemos de responder com a guerra.
Para alguns de vós, é o seu velho comandante-chefe que lhes fala, animado pelo mesmo patriotismo de sempre e a mesma firme determinação. Por isso vos trago uma palavra de confiança e de calma – aquela calma e confiança que um combatente pode manter, pois sabe que não cede e que, conscientemente, joga a sua vida pela Pátria.
Acabastes de ouvir as palavras do vosso comandante, que foram palavras de um português e de um militar, definindo bem os objectivos de 25 de Abril. Seremos fiéis à linha do Movimento e à pureza dos seus princípios. Ouvistes há dias a minha comunicação ao País, na hora histórica em que nos encontramos com nós próprios, demonstrando inequivocamente a sinceridade e a autenticidade de uma política. As palavras do vosso comandante, ao descrever uma passagem da sua comissão na Guiné, demonstram que aquela comunicação representou, efectivamente, a cúpula de uma linha coerente de pensamento.
Não é na demolição sistemática, não é na constante agressão ideológica, não é fomentando ódios, não é ofendendo gravemente as Forças Armadas e pondo em causa princípios consagrados da ética militar que se constrói o futuro. Mas podeis ter confiança. O Chefe Supremo das Forças Armadas é o mesmo de sempre e não se desviará da sua ética militar, que se afinal, a ética da Pátria. Não suportaremos que algum português duvide das intenções das Forças Armadas. Foram elas que se bateram no ultramar e que fizeram o 25 de Abril; e continuarão hoje a defender a Pátria com a mesma determinação.
Encaro o futuro do País com calma e com verdadeira confiança; e essa confiança assenta fundamentalmente no alto sentido de patriotismo das Forças Armadas, onde situo, entre os melhores, o Regimento de Pára-Quedistas. Nunca virastes a cara nas horas de perigo; e é com homens como vós que se constroem as pátrias. Assim como construímos no ultramar, nos últimos anos, algo de que nos podemos legitimamente orgulhar, assim assumimos, no 25 de Abril, a responsabilidade plena de construir uma mãe – pátria melhor e com mais justiça social. Formulo votos para que o futuro que estamos edificando seja digno de vós.
A JUNTA AMEAÇA (4/8/74)
O Programa do Movimento das Forças Armadas, de cuja execução a Junta de Salvação Nacional é constitucionalmente garante, impõe o respeito rigoroso da lei, pois o regime democrático que se propõe Instituir no País não pode construir-se se as instituições forem desrespeitadas e postergados os direitos e os deveres dos cidadãos.
Alguns elementos, agrupados em movimentos políticos extremistas ou agindo individualmente, têm vindo a desencadear acções que visam desacreditar as Forças Armadas e minar as Instituições políticas, com o objectivo de impedir o desenvolvimento do processo de democratização da vida política do País.
Estas acções, que têm deparado com a sentida oposição do povo português, não podem deixar de ser consideradas como crime de lesa - liberdade e lesa - democracia e, como tal, aqueles movimentos revelam-se declaradamente contra o espírito do Programa do Movimento das Forças Armadas.
Assim, todos os que actuarem criminosamente em concreta agressão ideológica às Forças Armadas, ou aos princípios proclamados pelo seu Movimento, quer através de meios escritos, quer em reuniões ou manifestações públicas, serão rigorosamente punidos.
A RENÚNCIA DE SPÍNOLA (30/9/74)
A crescente deterioração do clima social, económico e político, ultimamente mais acentuada, tem constituído, para mim, motivo de mais funda preocupação. Sobre as origens da situação a que chegamos me tenho debruçado num esforço de análise que sempre se orientou pela pureza dos princípios que informaram o espírito do 25 de Abril. Esforço de análise a que me obrigaram a minha consciência de português e a minha responsabilidade de Presidente da República, pois assumi, perante o País o compromisso de responder pela restauração das liberdades cívicas e pela construção de uma democracia Institucional autêntica. E nessa tarefa me empenhei com sinceridade inequívoca e férrea determinação.
É dessa análise e da posição que assumo com base nas conclusões alcançadas, que desejo informar o Conselho de Estado e o País, para que sobre elas se não teçam interpretações inexactas, nem se deturpe a honestidade das intenções que lhes presidiram.
Começarei por afirmar que não é de hoje nem de ontem a minha adesão ao espírito do Movimento das Forças Armadas. Desde a nomeação para o cargo de governador da Guiné que sempre expus frontalmente, primeiro sem publicidade por dever de ética, e depois publicamente, a minha total oposição ao ideário e aos métodos do velho regime. E isso sem rodeios nem eufemismo, antes falando a rude linguagem da verdade que, como soldado e como combatente, jamais deixei de utilizar.»
Estive com o Movimento desde a primeira hora, pelo que conheço perfeitamente o seu espírito e as suas intenções, a que aderi com uma sinceridade de que ninguém ousará duvidar. E são exactamente esse conhecimento e essa identificação que me conferem irrecusável autoridade moral para concluir que a origem da situação a que chegámos reside na desvirtuação do ideário do Movimento. Encontro-me perante a evidência de o Programa do Movimento das Forças Armadas estar a evoluir no quadro de uma acção política tendente, afinal, à sua própria neutralização, em verdadeiro clima de inversão de uma moral cívica à margem da qual se torna impossível a prática da democracia e da liberdade. Inversão em que, por fidelidade ao espírito do Movimento e pelo respeito aos compromissos que assumi ao aceitar este cargo, não devo nem posso, participar. Dois ou três pontos bastarão para o justificar.
Esteve no espírito do Movimento das Forças Armadas definir, concreta e objectivamente, uma política ultramarina que conduzisse à paz entre os portugueses de todas as raças e credos, objectivo que o anterior regime se revelou totalmente incapaz de atingir. Essa política definimo-la nós, ao estabelecer inequivocamente e com geral aceitação os princípios programáticos do processo de descolonização que o mundo e os homens de sã consciência reconheceram válidos. Toda essa política e o consequente processo de descolonização foram deturpados, numa intenção deliberada de os substituir por medidas antidemocráticas e lesivas dos reais interesses das populações africanas.
Esteve igualmente no espírito do Movimento das Forças Armadas promover a harmonia entre todos os credos políticos. Mas, essa harmonia jamais será possível quando, por um lado, os chefes declarados de alguns partidos políticos fazem apelo ao bom senso, e por outro lado os respectivos grupos de acção enveredam pela via de coacção psicológica através dos grandes meios de informação, e até da violência, em flagrante negação da liberdade e a pretexto da insinuação caluniosa logo lançada sobre os seus oponentes.
Esteve no espírito do Movimento das Forças Armadas reservar à Nação, através das suas legítimas instituições democráticas, a definição do perfil da sociedade que os Portugueses desejam construir. Mas esse princípio encontra-se claramente ameaçado, senão já de todo comprometido, pela sistemática cedência perante a realização larvar das reformas de fundo, que dia a dia se vão operando face ao clima vigente de ausência de lei.
Daí resulta que, no fim deste longo período de anemia, a Nação Portuguesa se encontrará perante situações irreversíveis, fortemente limitativas do estatuto constitucional que vier a ser escolhido em consenso popular. Tais situações estão, desse modo, retirando ao povo a sua real capacidade para o exercício da soberania.
O Programa do Movimento previa também que a substituição do regime deposto teria de processar-se sem convulsões internas que afectassem a paz, o progresso e o bem-estar do Povo Português. A situação é, infelizmente, bem diferente. Forjam-se reivindicações, postas nas mãos dos trabalhadores por burgueses frustrados do velho regime, subitamente titulados também de trabalhadores. A paz, o progresso e o bem-estar da Nação são comprometidos pela crise económica para que caminhamos aceleradamente, pelo desemprego, pela inflação incontrolada, pela quebra no comércio, pela retracção dos investimentos e pela ineficácia do poder central. Isto porque quanto se vem fazendo à sombra do Programa do Movimento das Forças Armadas pouco menos é do que o assalto aos meios de produção. É a reivindicação com base em decisões tomadas a níveis sem competência nem legitimidade para o fazer; enfim, é a inversão das estruturas, à margem da sanção democrática do povo. Anulam-se as leis do velho regime antes que novas leis regulem a vida política, social e económica do país e mesmo algumas das leis já publicadas são impunemente escarnecidas. Neste clima generalizado de anarquia em que cada um dita a sua própria lei, a crise e o caos são inevitáveis, em flagrantes contradições com os propósitos do Movimento. Por várias vezes chamei a atenção do País para as consequências a que tal estado de coisas acabaria por conduzir; e após profunda e demorada reflexão tomei nítida consciência de não estarmos a caminhar para o país novo que os Portugueses desejam construir.
Conclui assim ser inviável a construção da democracia sobre este assalto sistemático aos alicerces das estruturas e instituições por grupos políticos cuja essência ideológica ofende o mais elementar conceito de liberdade, em flagrante desvirtuação do espírito do 25 de Abril. Encontro-me, portanto, perante a impossibilidade de execução fiel ao Programa do Movimento das Forças Armadas, o meu sentido de lealdade inibe-me de trair o povo a que pertenço e para o qual, sob a bandeira de uma falsa liberdade, se estão preparando novas formas de escravidão.
Tenho dedicado toda a minha vida ao serviço da Pátria e não desejo que fique a pesar-me na consciência haver alguma vez traído aos meus concidadãos. Nestas condições, e perante a total impossibilidade de, no actual clima, se construir uma democracia autêntica ao serviço da paz e do progresso do País, renuncio ao cargo de Presidente da República.
Ao dirigir ao Conselho de Estado e ao Povo Português esta mensagem de renúncia, desejo reafirmar a minha indestrutível vinculação aos ideais da liberdade e da democracia e a minha inabalável obediência a princípios básicos de ética militar, que me inibe de participar em projectadas estruturas revolucionárias. E no momento em que, uma vez mais, o País está na iminência de ver esses ideais comprometidos, lanço o meu último apelo para que cada português conserve a necessária serenidade de espírito, se mantenha em paz, confie na força do voto secreto, a grande arma democrática dos homens ordeiros e livres, e jamais consinta que a sua consciência seja violada.
Termino formulando os mais ardentes votos para que a causa da liberdade e da democracia triunfe de facto sobre quantos dela se vêem apenas servindo. E levo comigo o conforto da certeza de tudo haver feito para manter intacto o espírito do 25 de Abril, do qual me constitui intransigente defensor e garante.
«O M. F. A. NÃO TEM PARTIDO» (6/11/74)
Tendo surgido ultimamente algumas referências susceptíveis de interpretações incorrectas sobre a ligação do M. F. A. com partidos ou movimentas políticos, a Comissão Coordenadora do Programa do M. F. A., através da 5,a.ª Divisão do BE. M. G. F. A., esclarece:
O M. F. A. fez uma revolução para derrubar o fascismo, devendo, portanto, a sua orientação ser considerada na linha progressista.
A À esquerda do fascismo (fórmula política do desespero para garantir a manutenção do capital monopolista) situa-se um leque de possíveis soluções todas eivadas em maior ou menor grau de tendências socialistas. São elas que representam o sentido progressista dia revolução, pois baseiam-se no reconhecimento de que o Estado terá de intervir para garantir o caminho da maior justiça social.
O M. F. A. não tem partido político, nem é um partido político.
O M. F. A., interpretando a vontade da esmagadora maioria dos portugueses, dinamiza as Forças Armadas que nele se vão transformando, polariza todas as forças democráticas e exige o cumprimento do programa que apresentou à Nação.
O M. F. A. encontra-se acima dos partidos políticos, aceitando todos os que se não oponham ao seu programa. Unido com o povo, assegura a instauração de uma autêntica democracia pluralista em Portugal.
O M. F. A. encontra-se atento relativamente àqueles que, camuflada mente, fazem o jogo da reacção, e combate, vigorosamente, todas as formas de sabotagem da ordem pré-democrática estabelecida.
O M. F. A. não se encontra comprometido com qualquer movimento político.
Acolhe e incentiva as forças antifascistas, mas não se vincula a nenhuma delas, porquanto são múltiplas as formas de expressão democrática e todas são necessárias e devem existir, traduzindo a variedade das opiniões e a prática das liberdades.
Costas GOMES ANUNCIA A DATA DAS ELEIÇÕES (11/2/75) As eleições para a Assembleia
Constituinte realizar-se-ão no dia 12 de Abril de 1975.
Proclamo publicamente esta data cumprindo os termos do n.º 6, art. 7 ° da Lei n.º 3/74.
Convém recordar que nas grandes linhas do Programa do MFA, descolonizar e democratizar eram as generosas motivações de homens corajosos que não dormiram a noite de 25 de Abril.
Ninguém tem dúvidas quanto aos passos fundamentais percorridos na descolonização, nessa ronda inevitável dos caminhos da História; ronda que se aproxima de um epílogo original, genuinamente português.
Pois bem, no caminhar para a Democracia a data que hoje fixei será um marco fundamental na longa rota a percorrer.
Estas primeiras eleições acabarão por determinar os homens a quem compete a transcendente responsabilidade de preparar a Constituição, a Lei fundamental que lançará o povo a que pertencemos no rumo do futuro.
Votar é um direito de todo o eleitor mas é simultaneamente um dever imperioso. Nenhum português se negará à responsabilidade de votar, de votar tão conscientemente quanto lhe seja possível.
Votar é colaborar, não votar é trair o Povo.
Aproveito a oportunidade de hoje para fazer um balanço geral dos resultados de menos de um ano da nossa Revolução.
Começarei por reconhecer tantos erros e desvios individuais e colectivos feitos por homens e organizações egoisticamente agarrados a velhos privilégios; por oportunismo pseudo – revolucionários de ambiciosos do Poder; por massas populares, gente simples e boa, que interesses ocultos polarizam e manejam.
Estamos a aprender esforçadamente a viver em liberdade. Decretos não bastam.
A vivência em sociedade livre terá de impregnar os sentimentos, as atitudes e os comportamentos de todos nós; teremos de a conquistar, integrá-la na nossa personalidade colectiva num processo não isento de vários sobressaltos.
Evitaremos as ditaduras que marginam a rota revolucionária que prosseguimos.
Aos homens sem fé, aos fracos de vontade e de espírito, aos que desertam na caminhada, batidos pelas dificuldades da Revolução, aos feridos nos privilégios, aos impacientes, aos injustamente traumatizados, a todos recomendaria a leitura da história de tantas revoluções libertadoras.
A caminhada para a liberdade tem sempre um preço social em suor, sangue e lágrimas; só a generosidade dos autênticos revolucionários e a bondade e civismo do Povo Português tem permitido preço social tão baixo.
Todos nós, Povo de Portugal, vamos lutar mais com o espírito, trabalhar mais com as mãos, perseverando mais com a vontade, para construir uma sociedade livre com um mínimo de sofrimentos injustos.
Chegam até mim clamores de impacientes e de idealistas, portugueses que criticam o que chamam "ritmo lento da nossa Revolução". Falam-me outros, nos quais incluo estadistas estrangeiros que conduziram as suas revoluções libertadoras, do perigo da aceleração excessiva do processo revolucionário.
A extrema dependência económica de um mundo em crise, a tarefa urgente da descolonização, o artificialismo do sistema das forças de produção, o atraso e distorção educacional, são algumas das pesadas heranças que limitam a capacidade de aceleração revolucionária, sob pena de rotura do equilíbrio social que desejaríamos manter.
É reconfortante verificar quanto se fez em menos de um ano de Revolução.
Milhões de almas, povos irmãos, foram colocados no caminho descolonizante, génese de novas pátrias de expressão lusíada.
O Povo Português, intoxicado de decénios de propaganda da extrema-direita, dispõe agora de uma informação pública com órgãos livres, onde já se procura criar o justo equilíbrio no pluralismo de opiniões.
Os responsáveis pela Economia e Finanças criaram uma estrutura orçamental mais adequada, uma distribuição mais justa da carga fiscal, aumentaram o «controle» do Estado sobre a banca e a economia privada e preparam-se para actuar na conjuntura com base no novo Plano Económico já aprovado.
Iniciaram-se as intervenções do Estado nas empresas privadas e na implantação da reforma agrária.
Os sectores eléctricos, petrolíferos, siderúrgicos, comércio internacional, distribuição cooperativa dos bens de consumo, construção de navios de pesca, e outros sectores começam já a sentir a nova orientação do Estado para os desviar de interesses capitalistas exclusivos e os colocar ao serviço do Povo.
No plano da Administração Interna tentam-se soluções de democratização e descentralização administrativa e mantém-se firme o rumo pré-eleitoral cheio de dificuldades.
Na política externa, a colaboração na descolonização, o reajustamento e alargamento das nossas relações internacionais tem sido uma tarefa imensa a protelar uma exploração internacional mais intensa da nova situação nacional. A renegociação da Concordata e do acordo dos Açores são já vantagens fundamentais a considerar em curto prazo.
Tudo o que se refere a transportes internos, marítimos e aéreos está em plena reconversão, bem como o problema habitacional, a utilização da energia, as obras públicas e a defesa do ambiente.
Nunca se trabalhou tão intensamente nos problemas de segurança nacional dos trabalhadores, onde se estão a criar ou melhorar esquemas de protecção contra a doença, o acidente, o desemprego e a velhice.
Nas relações capital/trabalho procura-se orientar uma turbulência excessiva, limitar aventuras pseudo – revolucionárias, mas importa sobretudo continuar a reforçar a luta ordeira mas firme dos trabalhadores que trabalham e por isso conquistam legítimos direitos a uma vida melhor e mais digna.
No campo da educação nacional tudo o que foi feito, incluindo a democratização da gestão dos estabelecimentos de ensino, a revisão dos programas primários, preparatórios e secundários, os acordos culturais, o trabalho de planeamento e preparação, parece não impressionar.
É um esforço camuflado pela selva imensa do que está por fazer, tarefa intrinsecamente gigantesca agravada por correntes extremistas de pensamento, por fascistas ou pseudo – revolucionários a quem Portugal Livre parece não convir.
Pensemos ainda no que se realizou ou preparou no campo da saúde, em medicina preventiva, em democratização do sistema hospitalar, em regularização das carreiras profissionais.
Gostaríamos de ter realizado mais e melhor, mas façamos justiça aos actuais responsáveis do Poder, trabalhadores infatigáveis que merecem alta cotação no mundo do trabalho honesto com que teremos de forjar um País democrático, autenticamente livre e justo.
Em termos fatalmente genéricos defini os eixos por onde avança a nossa Revolução, com o impulso e a segurança social na mão dos homens do M. F. A., das forças autenticamente democráticas e, sobretudo, do Povo ide Portugal.
Aos timoratos, aos privilegiados do anterior regime, a todos quantos agora se deixam entrar em ressonância com a descrença ou o alarmismo recomendaria mais coragem e vontade de colaborar no futuro das classes mais desfavorecidas sem pensar tanto na tranquilidade e no conforto próprio.
Aos ultopistas, aos vendedores de ilusões, aos cultivadores do ódio e da violência, aos vingativos, aos nefastos manipuladores da opinião pública recomendaria um exame de consciência e uma nova atitude face a um Povo que quer ser livre, trabalhar mais e distribuir melhor a riqueza produzida.
No Portugal novo irão caber todos os homens justos, trabalhadores de recta intenção.
Cabe agora, que vamos realizar as primeira eleições, chamar a atenção aos que, em palavras e escritos, se dirigem aos responsáveis do Poder exigindo medidas autocráticas para grandes e pequenos males que detectam ou julgam vislumbrar.
Estamos num Portugal novo; o poder autocrático e individual não voltará. O poder é e será exercido por órgãos colectivos emergentes de um sistema de forças democráticas. Haveremos de aceitar pequenos inconvenientes nas grandes vantagens da democracia pluralista em construção.
Terminarei com dois apelos. O primeiro quero dirigi-lo aos partidos autênticos, aqueles que verdadeiramente são representativos de segmentos genuínos do Povo de Portugal.
A felicidade possível de todos nós depende muito da vossa acção esclarecedora e pedagógica junto das massas populares. Intensificai tudo quanto contribua para a unidade no sentido de se construir uma democracia pluralista e livre e procurai esquecer os atritos possíveis na luta política.
Neste momento a hora é de construção de um sistema em que caibam todos os partidos autênticos; mais tarde, numa sociedade mais politizada, sendo livres sempre poderemos corrigir as posições relativas que justamente caibam a cada doutrina partidária.
Cordialidade, generosidade e lealdade na luta são atributos dos verdadeiros combatentes da liberdade.
O segundo apelo dirige a todos os eleitores. Votai, mas votai com consciência; não nos envergonhará a falta de cultura política porque até essa sempre nos foi negada e escamoteada.
Teremos agora de dialogar, escutar, ler, falar, estudar os programas partidários, treinar o nosso espírito crítico para obter uma escolha consciente e válida.
Não vejamos fantasmas nos arautos da liberdade, mas não aceitemos a ilusão dos fogos-fátuos, belos mas estéreis, de utopias totalitárias.
Sobretudo rejeitemos partidos ou doutrinas que oferecem para já a violência e o ódio em troca de um suposto paraíso futuro a que tal caminho jamais conduziria.
Saúdo o 12 de Abril de 1975, que prevejo padrão luminoso no avanço revolucionário que conduzirá à Democracia pluralista livre e autêntica.
Saúdo todos os eleitores que votem conscientemente em partidos válidos para a Revolução Portuguesa.
Vamos contribuir com o nosso voto para se obter uma Constituição que nos garanta um futuro em Liberdade, fraternidade, progresso e justiça social.
O SOCIALISMO É TAREFA DOS TRABALHADORES (COMUNICADO DO CONSELHO DA REVOLUÇÃO - 19/4/75)
O Conselho da Revolução apreciou a situação da economia na actual fase do processo revolucionário português, verificando, designadamente, a deficiente utilização da capacidade produtiva do País em recursos humanos e materiais, acompanhada da redução do nível de investimento, o crescente desequilíbrio da balança de pagamento e a persistência da pressão inflacionista, embora em atenuação nos últimos meses.
Tal situação é consequência natural do desenvolvimento dum processo revolucionário que tem vindo a desmantelar o poder do capital monopolista, agravada pela reacção dos seus detentores, que a todo o custo têm tentado impedir a perda dos seus privilégios.
Vivemos assim uma crise largamente resultante não só das estruturas económicas do fascismo e colonialismo como da desagregação do sistema capitalista em Portugal. Ë agora necessário e imperioso reconstruir a economia por uma via de transição para o socialismo. Está em causa consolidar os primeiros concretos da nossa revolução socialista e realizar novos avanços nessa direcção, atendendo a dois objectivos primordiais:
Garantir a independência nacional no arranque para um socialismo verdadeiramente português, evitando situações extremas de crise económica que nos coloquem em reforçadas e delicadas dependências externas; e identificar a dinâmica da classe trabalhadora com um projecto de construção do socialismo.
O Conselho da Revolução analisou os trabalhos em curso no âmbito do Conselho Económico relativo à preparação dos programas de medidas económicas de emergência, tendo definido as seguintes orientações gerais:
- É necessário que os trabalhadores sintam que a economia já não lhes é estranha, ou seja, que a construção socialista da economia é tarefa deles e para eles. Isto implica a afirmação clara do princípio de controlo organizado de produção pelos trabalhadores para objectivos de produção e eficiência coordenados pelos órgãos centrais de planeamento segundo esquemas a definir com brevidade.
- É indispensável estabelecer uma limitação dos consumos a partir dum princípio de máximo nacional de rendimento disponível extensível aos titulares de todos os rendimentos e não apenas ao trabalho por conta de outrem
- Igualmente se torna indispensável garantir a contenção dos preços de bens essenciais,sobretudo alimentares.
- Deverão ser completados os passos já dados no sentido da nacionalização dos sectores básicos de actividade económica (indústria, transportes e comunicações).
- Deverá ser aplicado um programa progressivo de reforma agrária integrado num todo coerente de medidas de política económica.
- Verificadas as condições anteriores, será legítimo fazer apelo à mobilização dos trabalhadores para o emprego produtivo, mobilização necessária à construção da sociedade desejada pelo povo português.
As posições definidas na reunião de ontem do Conselho da Revolução, a efectivarem-se num breve prazo, traduzir-se-ão em passos no arranque para uma via socialista já apontada pelas vanguardas do povo e também na última Assembleia do M. F. A., onde além de oficiais participaram sargentos e praças.
Os esforços desenvolvidos desde o aberto comprometimento do M. P. A. com a via que abrira em 25 de Abril têm até agora dado resultados limitados, embora particularmente vivos cada vez que se responde aos ataques da reacção (nomeadamente após o 28 de Setembro e o 11 de Março). Esses esforços tiveram reflexo nomeadamente no último relatório da Organização da Coordenação e Desenvolvimento Económico, segundo a qual Portugal foi um dos países onde a taxa de inflação baixou em relação a períodos anteriores, pese embora seja ainda muito alto o ritmo de aumento de preços.
É ainda no sentido de diminuir a inflação que se devem compreender as linhas gerais agora definidas. E elas são coerentes.
A inflação é, no fundo, o aumento sucessivo de preços que tanto preocupa e desmoraliza os trabalhadores, que vêem os seus melhores salários desaparecerem, ultrapassados pelos preços de mercado. Ela é, por outro lado, resultado das diferenças entre os meios de consumo e os de produção, quando os primeiros pressionam o aumento de preços sempre que não existe aumento de produção.
Um efectivo meio de combate à inflação é a limitação do consumo e o aumento de produção, equilíbrio que se consegue através da acentuação de um dos factores de equilíbrio: o da produção à custa dos trabalhadores e do consumo à custa dos privilegiados.
Esta base é essencialmente para compreender a definição das várias linhas de arranque para o socialismo agora feita pelo Conselho da Revolução, nomeadamente quando se refere «limitação dos consumos a partir de um princípio máximo nacional de rendimento disponível extensível aos titulares de todos os rendimentos e não apenas dos empregados», isto é, vai atacar-se realmente os exploradores, que, nada fazendo, vivem dos rendimentos do trabalho de outros, e já não haverá apenas um equilíbrio entre os privilegiados e as classes desfavorecidas.
Com estas e outras medidas, como nacionalização de actividade económica, contenção dos preços essenciais, reforma agrária, o Conselho da Revolução espera legitimamente conseguir a mobilização dos trabalhadores, tão necessária à construção da sociedade desejada pelo povo português
ASSEMBLEIA DO M. F. A. DA ARMADA DEFENDE SISTEMA PLURIPARTIDÁRIO
PARA O SOCIALISMO (19-4-75)
A nova Assembleia do M. F. A. da Armada, constituída por oficiais, sargentos e praças, reunida em 19 de Abril de 1975, declara que orientará as suas actividades segundo os princípios já emanados do Conselho da Revolução em especial: Reconhecimento do carácter socialista da revolução portuguesa, entendendo-se como tal o caminho firme no sentido de passagem capitalista para a colectivização dos meios de produção terminando com a exploração do homem pelo homem.
Na ordem política interna, a constituição de um sistema pluripartidário formado pelas forças políticas verdadeiramente interessadas na revolução socialista de forma a garantir a construção do socialismo, a defesa eficaz do processo revolucionário e as liberdades democráticas.
Na ordem política externa, a garantia de uma total independência nacional, de acordo com os princípios de não ingerência nos assuntos internos das nações e de uma ampla solidariedade com todos os povos do mundo, em particular com os de língua portuguesa.
Na Armada, seu fortalecimento no sentido de sua inteira colocação ao serviço dos interesses da grande maioria do povo português, tornando consequente a aliança povo M. F. A. e sua democratização na construção de uma disciplina consciente e revolucionária baseada na igualdade de oportunidades de aceso e na hierarquia da competência.
COSTA GOMES ENCERRA A CAMPANHA ELEITORAL (24/4/75)
No eterno devir da História, poucas horas caíram sobre o encerramento da primeira campanha eleitoral do Portugal novo, mais independente e mais livre.
Entrámos no período que a lei e o bom-senso destinam à meditação dos eleitores na antecâmara de uma transcendente decisão. Vamos escolher e votar no partido que a consciência nos indique como o mais apto a intervir no futuro do povo que somos.
«Procurarei integrar-me bem nos objectivos do MFA ao cumprir a minha missão de dirigir uma palavra amiga ao povo a que orgulhosamente pertenço.
Desempenharemos todos amanhã o acto decisivo do esquema eleitoral, a colocação nas urnas do nosso boletim de voto.
Sobre o valor deste acto da vontade, temos ouvido opiniões variáveis, desde um extremismo de o considerar supérfluo e nefasto, ao outro extremismo de o considerar como essência de todo o pensamento e teorização da ciência política.
No estádio actual da civilização humana, a vontade popular é a verdadeira fonte do poder político.
A determinação desta vontade colectiva, quando feita por um esquema eleitoral, como toda a obra humana, incorpora alguns defeitos, a par de muitas virtudes e certezas.
Hipertrofiando uns ou outras, é possível construir raciocínios que condenem ou sacralizem a aplicação de um sistema eleitoral.
Seja como for, dentro dos actuais conceitos da ciência política, as soluções eleitorais são aquelas que melhor garantem a definição da vontade popular e, quando pluralistas, têm a altíssima vantagem de garantirem permanentes ratificações ou correcções.
Acreditamos sinceramente que, ao escolher esta via de análise, democrática e pluralista, o MFA ofereceu a melhor das soluções possíveis ao seu representado e aliado, o povo de Portugal.
Considerada indiscutível esta solução, façamos todo o balanço da importante fase já concluída, a campanha eleitoral, onde o povo e os partidos desempenharam os papéis fundamentais.
Não nos alarmemos com certos desvios a que gente simples e boa se deixou conduzir por agitadores pseudo – revolucionários e reaccionários de extremismos opostos. Em termos gerais, com saldo altamente positivo, o povo demonstrou elevado civismo e suficiente politização para desarmar intelectuais paternalistas, observadores pessimistas e os arautos das convulsões sociais.
O povo mereceu um voto de confiança no futuro.
Quanto aos partidos, não generalizemos culpabilidades esquemáticas. Havemos de colocar fora da análise os utopistas, os cultivadores do ódio e da violência, manipuladores do substrato inferior do inconsciente colectivo.
Considerando apenas os partidos autênticos, resolvemos as poucas atitudes discutíveis para sublinhar o amplo contributo dos esforços sérios de acção didáctica e esclarecimento democrático que souberam realizar.
Mereceram um voto de esperança na democracia pluralista do socialismo português em gestão.
Fechemos aqui o balanço do passado próximo e reportemo-nos ao futuro imediato, o exercício do voto no dia memorável de 25 de Abril de 1975.
Votar é um dever de consciência, votar conscientemente é um dever nacional.
Procuraremos todos com afinco estudar a decisão final, se ainda não a tivermos feito, com a certeza de que o essencial é exactamente esse esforço de procura, essa decisão como acto último da vontade política de um povo que quer ser livre.
Nas grandes crises políticas da nação, o povo português sempre decidiu com uma consciência intuitiva, que ultrapassou em validade a consciência racionalista de elites amolecidas.
Eu acredito no progressismo empírico do povo que somos. Escolheremos entre os partidos autênticos que não barram a via socialista e que nos prometeram o pluralismo essencial ao exercício da liberdade.
Ao terminar, considerada indiscutível a necessidade de votar, desejo sublinhar também a extraordinária importância de que este 25 de Abril seja um dia onde imperem a ordem e a serenidade característica do povo português.
No plano nacional, o clima tranquilo, afastará fantasmas ideológicos; muitos privilegiados do antigo regime temem menos os prejuízos materiais do que os indefinidos terrores políticos que a ditadura inculcou no seu inconsciente colectivo.
No plano externo, o civismo calmo que todos esperamos recordará ao Mundo que meio século de ditadura não destruiu os valores sociais de oito séculos de história ímpar.»
Aqui (Posto de Comando do Movimento das Forças Armadas. As Forças Armadas Portuguesas apelam para todos os habitantes da cidade de Lisboa no sentido de recolherem a suas casas nas quais se devem conservar com a máxima calma. Esperamos sinceramente que a gravidade da hora que vivemos não seja tristemente assinalada por qualquer acidente pessoal para o que apelamos para o bom senso dos comandos das forças militarizadas no sentido de serem evitados quaisquer confrontos com as Forças Armadas. Tal confronto, além de desnecessário, só poderá conduzir a sérios prejuízos individuais que enlutariam e criariam divisões entre os portugueses, o que há que evitar a todo o custo.
Não obstante a expressa preocupação de não fazer correr a mínima gota de sangue de qualquer português, apelamos para o espírito cívico e profissional da classe médica esperando a sua ocorrência aos hospitais, a fim de prestar a sua eventual colaboração que se deseja,sinceramente,desnecessária.
Às 4,45 horas
A todos os elementos das forças militarizadas e policiais o comando do Movimento das Forças Armadas aconselha a máxima prudência, a fim de serem evitados quaisquer recontros perigosos.
Não há intenção deliberada de fazer correr sangue desnecessariamente, mas tal acontecerá caso alguma provocação se venha a verificar.
Apelamos para que regressem imediatamente aos seus quartéis, aguardando as ordens que lhes serão dadas pelo Movimento das Forças Armadas.
Serão severamente responsabilizados todos os comandos que tentarem, por qualquer forma, conduzir os seus subordinados à luta com as Forças Armadas.
Apelo às forças militarizadas
Aqui Posto de Comando das Forças Armadas. Informa-se a população de que, no sentido de evitar todo e qualquer incidente, ainda que involuntário, deverá recolher às suas casas, mantendo absoluta calma.
A todos os componentes das forças militarizadas, nomeadamente às forças da G. N. R., P. S. P. e ainda às forças da ID. G. S. e da Legião Portuguesa, que abusivamente foram recrutadas, lembra-se o seu dever cívico de contribuírem para a manutenção da ordem pública, o que na presente situação só poderá ser alcançado se não for oposta qualquer reacção às Forças Armadas. Tal reacção nada teria de vantajoso pois apenas conduziria a um indesejável derramamento de sangue que em nada contribuiria para a união de todos os portugueses.
Embora estando crentes no civismo e no bom senso de todos os portugueses no sentido de evitarem todo e qualquer recontro armado, apelamos para que os médicos e pessoal de enfermagem se apresentem aos hospitais para uma colaboração que fazemos votos por que seja desnecessária.
Às 5 horas
Atenção elementos das forças militarizadas e policiais. Uma vez que as Forças Armadas decidiram tomar a seu cargo a presente situação será considerado delito grave qualquer oposição das forças militarizadas e policiais às unidades militares que cercam a cidade de Lisboa.
A não obediência a este aviso poderá provocar um inútil derramamento de sangue cuja responsabilidade lhes será inteiramente atribuída.
Deverá por conseguinte, conservar-se dentro dos seus quartéis até receberem ordens do Movimento das Forças Armadas.
Os comandos das forças militarizadas e policiais serão severamente responsabilizados caso incitem os seus subordinados à luta armada.
Às 7,30 horas
Conforme tem sido difundido, as Forças Armadas desencadearam na madrugada de hoje uma série de acções com vista à libertação do País do regime que há longo tempo o domina.
Nos seus comunicados as Forças Armadas têm apelado para a não intervenção das forças policiais com o objectivo de se evitar derramamento de sangue. Embora este desejo se mantenha firme, não se hesitará em responder, decidida e implacavelmente, a qualquer oposição que venha a manifestar-se.
Consciente de que interpreta os verdadeiros sentimentos da Nação, o Movimento das Forças Armadas prosseguirá na sua acção libertadora e pede à população que se mantenha calma e que se recolha às suas residências. Viva Portugal!
As 10,30 horas
O Posto de Comando do Movimento das Forças Armadas constata que a população civil não está a respeitar o apelo já efectuado várias vezes para que se mantenha em casa.
Pede-se mais uma vez à população que permaneça nas suas casas a fim de não pôr em perigo a sua própria integridade física. Em breve será radiodifundido um comunicado esclarecendo o domínio da situação.
Às 11,45 horas
Na sequência das acções desencadeadas na madrugada de hoje, com o objectivo de derrubar o regime que há longo tempo oprime o País, as Forças Armadas informam que de Norte a Sul dominam a situação e que em breve chegará a hora da libertação.
Recomenda-se de novo à população que se mantenha calma e nas suas residências para evitar incidentes desagradáveis cuja responsabilidade caberá integralmente às poucas forças que se opõem ao Movimento.
Chama-se a atenção de todos os estabelecimentos comerciais de que devem encerrar imediatamente as suas portas, colaborando desta forma com o Movimento, de modo a evitar açambarcamentos desnecessários e inúteis.
Caso esta determinação não seja acatada, será forçoso decretar o recolher obrigatório. Ciente de que interpreta fielmente os verdadeiros sentimentos da Nação, o Movimento das Forças Armadas prosseguirá inabalavelmente na missão que a sua consciência de portugueses e militares lhes impõe. Viva Portugal!
Às 13 horas
O Movimento dias Forças Armadas informa as famílias de todos os seus elementos que eles se encontram bem e que tudo decorre dentro do previsto.
Pretendendo continuar a informar o Pais sobre o desenrolar dos acontecimentos históricos que se estão processando, o Movimento das Forças Armadas comunica que as operações, iniciadas na madrugada de hoje, se desenrolam de acordo com as previsões, encontrando-se dominados vários objectivos importantes, de entre os quais se citam os seguintes:
- Comando da Legião Portuguesa;
- Emissora Nacional;
- Rádio Clube Português;
- Radiotelevisão Portuguesa;
- Rádio Marconi;
- Banco de Portugal;
- Quartel-General da R. M. de Lisboa;
- Quartel-General da R. M. do Porto;
- Instalações do Quartel – Mestre – General;
- Ministério do Exército, donde o respectivo ministro se pôs em fuga;
- Aeroporto da Portela;
- Aeródromo Base n.º l;
- Manutenção Militar;
- Posto de Televisão de Tróia;
- Penitenciária do Forte de Peniche.
Sua Ex.ª o almirante Américo Tomás, Sua Ex.ª o Prof. Marcelo Caetano e os membros do Governo encontram-se cercados por forças do movimento no quartel da Guarda Nacional Republicana, no Carmo, e no Regimento de Lanceiros 2 tendo já sido apresentado um ultimato para a sua rendição.
O Movimento domina a situação em todo o País e recomenda, uma vez mais, que toda a população se mantenha calma. Renova-se também a indicação já difundida para encerramento imediato dos estabelecimentos comerciais, de forma a não ser forçoso o decretar do recolher obrigatório. Viva Portugal!
Às 15 horas
O Movimento das Forças Armadas, tendo conhecimento de que elementos da Guarda Nacional Republicana se fazem passar por elementos amigos avisa de que tais elementos são adversos, pelo que aconselha a população a abandonar o Largo do Carmo, o Rossio e o Camões.
Às 17,30 horas
O Movimento das Forças Armadas têm ocupados os estúdios da R. T. P. em Lisboa e no Porto, embora no centro emissor de Monsanto se registe uma interferência provocada por forças da reacção, que, a todo o momento serão dominadas. Logo de seguida, a Radiotelevisão Portuguesa entrará ao serviço do Movimento das Forças Armadas e do Pais,noticiando os seus comunicados.
Às 18,20 horas
Aqui posto de comando das Forças Armadas. Em aditamento ao último comunicado, o Movimento das Forças Armadas informa a Nação que conseguiu forçar a entrada no quartel da Guarda Nacional Republicana, situado no Largo do Carmo, onde se encontrava o ex. – Presidente do Conselho e outros membros do seu ex. – Governo.
O Regimento de Lanceiros 2, onde se recolheram outros elementos do seu ex. -Governo, entregou-se ao Movimento das Forças Armadas, sem que houvesse necessidade do emprego da força que os cercava.
A quase totalidade da Guarda Nacional Republicana, incluindo o seu comando e a maioria dos elementos da Polícia de Segurança Pública, já se rendeu ao Movimento das Forças Armadas.
O M. F. A. agradece à população civil todo o carinho e apoio que tem prestado aos seus soldados, insistindo na necessidade de ser mantido o seu valor cívico ao mais alto grau. Solicita também que se mantenha nas suas residências durante a noite, a fim de não perturbar a consolidação das operações em curso, prevendo-se que possa retomar as suas actividades normais amanhã, dia 26. Viva Portugal!
Às 19,50 horas
Posto de contando do Movimento das Forças Armadas.
Continuando a dar cumprimento à sua obrigação de manter o País ao corrente do desenrolar dos acontecimentos, o Movimento das Forças Armadas informa que se concretizou a queda do Governo, tendo Sua Ex.ª o Prof. Marcelo Caetano apresentado a sua rendição incondicional a Sua Ex.ª o general António de Spínola. O ex-presidente do Conselho, o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e o ex-ministro do Interior encontram-se sob custódia do Movimento, enquanto Sua Ex.ª o almirante Américo Tomás e alguns ex-ministros do Governo se encontram refugiados em dois aquartelam entoa que estão cercados pelas nossas tropas e cuja rendição se aguarda para breve.
O Movimento das Forças Armadas agradece a toda a população o civismo e a colaboração demonstrados de maneira inequívoca desde o início dos acontecimentos, prova evidente de que ele era o intérprete do pensamento e dos anseios nacionais.
Continua a recomendar-se a maior calma e a estrita obediência a todas as indicações que forem transmitidas. Espera-se que amanhã a vida possa retomar o seu ritmo normal, para que todos, em perfeita união, consigamos construir um futuro melhor para o País. Viva Portugal!
Às 21 horas
Aqui posto de comando do Movimento das Forças Armadas. Segundo comunicação telefónica aqui recebida cerca das 20.30, ter-se-iam verificado incidentes na Rua António Maria Cardoso, onde se situa a sede da D. G. S.
No decorrer desses incidentes, foram feridas algumas pessoas, encontrando-se já no local assistência médica. Aguarda-se a todo o momento a intervenção das Forças Armadas. Estes incidentes vêm mais uma vez confirmar a necessidade de a população civil cumprir o pedido formulado pelo M. F. A., recolhendo às suas residências e mantendo a calma.
Para conhecimento de toda a população informa-se que se encontram sanados os incidentes ocorridos com a Polícia de Segurança Publica e que, a partir deste momento, ela aderiu totalmente ao movimento. Assim com a finalidade de manter a ordem e salvaguardar as vidas e os bens, pede-se a todos que aceitem, obediente e prontamente, quaisquer indicações que lhes sejam transmitidas por elementos daquela corporação ou da Polícia Militar. Igualmente deverão ser obedecidos os agentes das Brigadas de Trânsito. Torna-se indispensável que a população continue a manifestar a sua compreensão e civismo. E a melhor forma de o fazer no momento é manter-se calmamente nas suas residências.
AS RAZÕES DO MOVIMENTO (COMUNICADO DO M. F. A. - 25/4/74) Considerando que ao fim de 13 anos de luta em terras do Ultramar, o sistema político vigente não conseguiu definirem concreta e objectivamente uma política ultramarina que conduza à Paz entre os Portugueses de todas as raças e credos.
Considerando o crescente clima de total afastamento dos Portugueses em relação às responsabilidades políticas que lhes cabem como cidadãos em crescente desenvolvimento de uma tutela de que resulta constante apelo a deveres com paralela denegação de direitos;
Considerando a necessidade de sanear as instituições, eliminando do nosso sistema de vida todas as ilegitimidades que o abuso do poder tem vindo a legalizar.
Considerando, finalmente, que o dever das Forças Armadas é a defesa do País como tal se entendendo também a liberdade cívica dos seus cidadãos, o Movimento das Forças Armadas, que acaba de cumprir com êxito a mais importante das missões cívicas dos últimos anos da nossa História, proclama à Nação a sua intenção de levar a cabo, até à sua completa realização, um programa de salvação do País e da restituição ao Povo Português das liberdades cívicas de que tem sido privado.
Para o efeito entrega o Governo a uma Junta de Salvação Nacional a que exige o compromisso com as linhas gerais do programa do Movimento das Forças Armadas, que através dos órgãos informativos será dado a conhecer à Nação, no mais curto prazo consentido pela necessidade de adequação das nossas estruturas, promover eleições gerais de uma Assembleia Nacional Constituinte, cujos poderes pôr sua representatividade e liberdade na eleição permitam ao País escolher livremente a sua forma de vida social e política.
Certos de que a Nação está connosco e que, atentos aos fins que nos presidem, aceitará de bom grado o Governo Militar que terá de vigorar nesta fase de transição, o Movimento das Forças Armadas apela para a calma e civismo de todos os portugueses e espera do País adesão aos poderes instituídos em seu benefício.
Saberemos deste modo honrar o passado no respeito pêlos pelos compromissos assumidos perante o País e por este perante terceiros. E ficamos na plena consciência de haver cumprido o dever sagrado (Já da restituição ia à Nação dos seus legítimos e legais poderes.
PROCLAMAÇÃO AO PAÍS LIDA POR SPÍNOLA (26/4/74)
Em obediência ao mandato que acaba de lhes ser confiado pelas Forças Armadas, após o triunfo do Movimento em boa hora levado a cabo pela sobrevivência nacional e pelo bem-estar do Povo Português, a Junta de Salvação Nacional, a que presido, constituída por imperativo de assegurar a ordem e de dirigir o País para a definição e consecução de verdadeiros objectivos nacionais, assume perante o mesmo o compromisso de:
- Garantir a sobrevivência da Nação, como Pátria Soberana no seu todo pluricontinental;
- Promover, desde já, a consciencialização dos Portugueses, permitindo plena expressão a todas as correntes de opinião, em ordem a acelerar a constituição das associações cívicas que hão-de polarizar tendências e facilitar a livre eleição, por sufrágio directo, de uma Assembleia Nacional Constituinte e a sequente eleição do Presidente da República;
- Garantir a liberdade de expressão epensamento;
-Abster-se de qualquer atitude política que possa condicionar a liberdade da eleição e a tarefa da futura Assembleia Constituinte e evitar por todos os meios que outras forças possam interferir no processo que se deseja eminentemente nacional;
- Pautar a sua acção pelas normas elementares da moral e da justiça, assegurando a cada cidadão os direitos fundamentais estatuídos em declarações universais e fazer respeitar a paz cívica, limitando o exercício da autoridade à garantia da liberdade dos cidadãos;
- Respeitar os compromissos internacionais decorrentes dos tratados celebrados;
- Dinamizar as suas tarefas em ordem em que no mais curto prazo o País venha a governar-se por instituições de sua livre escolha;
- Devolver o poder às instituições constitucionais logo que o Presidente da República eleito entre no exercício das suas funções.
A JUNTA ADVERTE (3/5/74)
Embora a Junta de Salvação Nacional se sinta reconhecida pelo exuberante apoio dado ao Movimento das Forças Armadas pelo Povo Português, pêlos pelos movimentos políticos e sindicatos, comunica ao País que não pode consentir, nem consentirá, que a sua autoridade – garante da defesa dos sãos princípios democráticos - seja afectada por procedimentos não previamente sancionados pelo Poder que assumiu e exerce.
Enquanto não for constituído o Governo provisório, compete aos Departamentos oficiais vigentes continuar a dirigir a vida da Nação e a regular as actividades públicas e privadas, sendo considerados actos de insubordinação e crimes contra o Movimento das Forças Armadas, e, como tal, vigorosamente reprimidas, investigadas e julgadas todas as interferências de pessoas, grupos e instituições na condução que só ao poder constituído compete. Toda e qualquer colaboração, bem como sugestões de medidas de saneamento a tomar deverão ser oferecidas e apresentadas aos delegados da Junta de Salvação Nacional junto dos respectivos departamentos, aos quais cumpre tomar as decisões que as circunstâncias aconselharem.
Procedimento contrário, embora por vezes bem intencionado, compromete os fins da real democratização e liberalização que inspirou o Movimento das Forças Armadas, podendo afectar a confiança que no mesmo deposita a Nação e conduzir ao sistema totalitário que o País quer definitivamente abatido.
A Junta de Salvação Nacional está crente que todos os portugueses verdadeiramente conscientes e bem formados reconhecem que não se podem pôr em prática de um dia para o outro as medidas que se impõe tomar, e que só progressivamente na ordem e na disciplina se poderá garantir ao País as liberdades fundamentais.
SPÍNOLA É PROCLAMADO PRESIDENTE DA REPÚBLICA (15/5/74)
PROCLAMAÇÃO
De harmonia com a decisão da Junta de Salvação Nacional que assumiu a direcção dos destinos da Nação, a partir do dia 25 de Abril último, tenho a honra de proclamar Presidente da República o general António de Spínola que exercerá as suas funções com os poderes semelhantes aos previstos na actual Constituição até às eleições gerais a realizar dentro de um ano.
PALAVRAS PROFERIDAS PELO GENERAL COSTA GOMES
SENHOR PRESIDENTE DA REPUBLICA:
Os jovens do Movimento das Forças Armadas realizaram em 25 de Abril a mais digna Revolução da História Contemporânea.
A Junta de Salvação Nacional, por eles escolhida, em acto de inspiração e justiça elegeu V. Ex.ª para representante maior do Povo de Portugal.
As minhas palavras não adicionarão um átomo à sua estatura profissional de soldado ou ao seu perfil de político e homem de letras.
Recordamo-lo como capitão empreendedor que restabeleceu a Revista de Cavalaria e a dirigiu durante tantos anos.
Vemo-lo consagrado no Norte de Angola como chefe militar, tão ousado e valoroso que o adversário o considerava invulnerável às balas.
Reconhecemo-lo no Sul, em tarefas de promoção social, apóstolo da paz nas relações com Cuanhamas e Cuamatos.
Encontramo-lo na Guiné tão sereno frente ao perigo como humano na acção governativa; do irmão Spínola falam os Guinéus que o veneram.
A culminar uma longa bibliografia poli facetada, surge na plenitude do seu talento político – literário o Livro da esperança nacional que foi o idearia da Revolução das Cravos.
Que Deus o proteja para Bem do Povo e glória de Portugal.
DISCURSO DE ANTÓNIO DE SPÍNOLA
Portugueses: Ao ser investido nas funções de Presidente da República por decisão da Junta de Salvação Nacional, sinto-me no dever de me vincular ao idearia do Movimento das Forças Armadas, à luz do qual se cumprirá a tarefa de construção do futuro e por cuja execução assumo, perante o País, o mais solene compromisso.
São para as Forças Armadas as minhas primeiras palavras. Vilipendiadas pelas atitudes servis de alguns dos seus chefes, injustamente acusadas dos erros dos políticos, violentadas a coberto do seu elevado sentido da honra e do dever, quase destruídas, em suma, no que representavam de instituição eminentemente nacional, as Forças Armadas, pela mão dos seus quadros mais jovens, souberam apesar de tudo mobilizar a sua última reserva moral colocando-se ao serviço da Nação, de que há décadas haviam sido desviadas.
A Pátria deve a hora grandiosa que hoje vive a esses jovens que souberam manter acesa a chama do dever, e que, na nobreza do seu idealismo, arrastaram com eles à vitória o Povo Português. Na consciência de que a plenitude da soberania pertence à Nação, cabendo às Forças Armadas a sua instante defesa, o Movimento das Forças Armadas, em rasgo de serena audácia e perfeita isenção, restituiu Portugal ao seu Povo. Jamais os Portugueses poderão esquecer o verdadeiro alcance da gesta libertadora destes magníficos militares que salvaram o País da tragédia nacional para que se caminhava. Devemos ao seu patriotismo e ao seu sentido do dever como servidores do Povo sem partidarismos, o momento histórico que a Nação vive. E por mais eloquentes que sejam as palavras, só a História e os vindouros saberão julgar toda a extensão e incomensurável serviço prestado à Pátria e ao Povo Português do Movimento das Forças Armadas.
Vividas as primeiras semanas de natural explosão emotiva, pontuada todavia por alguns excessos lesivos do clima de tranquilidade cívica cuja firme salvaguarda se impõe, o País vai entrar numa fase de reflectida ponderação, iluminada pelo reconhecimento de que democracia não significa anarquia, e de que a confusão dispersiva de actuações descoordenadas não ajuda, de modo algum, a construção do futuro que o Povo Português anseia.
O desrespeito pela ordem social decorrente de uma sólida fundamentação democrática e do perfeito funcionamento de instituições representativas, foi sempre, em todos os tempos e latitudes, a porta por onde entraram os ditadores. Bem gostaríamos de a ter encerrado definitivamente; mas só o conseguiremos quando cada português impuser a si próprio, em livre expressão da sua capacidade para o exercício da cidadania, o mais alto padrão de disciplina cívica, sem o qual jamais poderá edificar-se uma autêntica democracia.
Impõe-se-nos, antes de mais, fazer um profundo exame de consciência, para concluir se será, de facto, democrático o processo esboçado de decidir e aplicar decisões fraccionárias antes de o Povo definir, em consenso, o tipo de sociedade em que deseja viver. E que a democracia e o governo do povo, pelo povo e para o povo, não podendo entender-se senão na mais inteira liberdade de expressão, associação, reunião, debate e votação das decisões colectivas pela via de instituições legítimas, logo seguida da mais estrita observância das decisões assim tomadas. Creio firmemente ser essa a única forma de vida política onde cabe a dignidade humana; de resto, foi em nome desse ideal cívico que as Forças Armadas libertaram o País.
A democracia não se conquista; talvez mesmo se não construa; a democracia vive-se. E, assim, o nosso propósito não pode ser outro senão o lançamento de bases sólidas para essa vivência; propósito aliás claramente expresso no programa do Movimento das Forças Armadas que vale a pena evocar nos seus traços essenciais.
Reitero por isso o programa traçado, tendente a promover a estruturação partidária e associativa em clima da mais completa abertura, devendo o poder instituído assegurar que as liberdades de uns não sejam ameaçadas por excessos de outros. Empenhar-nos-emos em evitar, por todos os meios, que o processo de politização dos cidadãos possa ser entravado ou comprometido, constituindo ponto firme do nosso programa o desmantelamento do aparelho repressivo do antigo regime. Mas os caminhos que o País haverá de trilhar terão de ser definidos por instituições democráticas verdadeiramente representativas e solidamente implantadas, através das quais todos os cidadãos possam exprimir-se, onde todas as correntes de opinião se façam ouvir e em cujo topo se encontre, em lírica expressão final da soberania, uma Câmara Legislativa constituída por mandatários incontestáveis do Povo português. Serão as decisões dessa Câmara, depois de referendadas, que definirão o nosso estatuto político, económico e social. E só então nascerá, de facto, o Portugal renovado que ambicionamos.
Entretanto, os nossos esforços centrar-se-ão no restabelecimento da paz no Ultramar; mas o destino do Ultramar português terá de ser democraticamente decidido por todos os que àquela terra chamam sua. Haverá que deixar-lhes inteira liberdade de decisão; e em África, como aqui, evitaremos por todas as formas que a força de minorias, sejam elas quais forem, possa afectar o livre desenvolvimento do processo democrático em curso.
Nesta linha de pensamento, desejamos firmemente, em plena corporização dos ideais do Movimento triunfante, que a paz volte ao Ultramar. E pensamos que o regresso dos partidos africanos de emancipação ao quadro da actividade política livremente desenvolvida será a prova cabal do seu idealismo e o mais útil contributo para o pleno esclarecimento e a perfeita consciencialização dos povos africanos, em ordem a uma opção final conscientemente promovida e escrupulosamente respeitada.
Na ordem interna, empenhar-nos-emos em tornar representativas as organizações políticas, sociais e económicas, reparar injustiças sociais e cívicas, recuperar valores e assegurar o justo equilíbrio nas relações de trabalho.
Para tanto, haverá que acelerar o ritmo de expansão económica; garantir, dentro dos sãos princípios da ordem democrática, a completa liberdade sindical dos trabalhadores e do patronato; desmantelar o antigo controlo corporativo e aniquilar os seus estrangulamentos; criar um clima propício à constituição de partidos e associações político-económicas que exprimam todas as correntes de opinião; promover a livre eleição da nova Assembleia Constituinte; sujeitar a referendo a Lei Fundamental que definirá o estatuto de livre escolha do Povo Português; e finalmente entregar o Poder às novas instituições livremente constituídas e como tal perfeitamente legitimadas.
É evidente que terá de proceder-se, em paralelo, ao saneamento moral do País e à reformulação de todo um complexo de conceitos de justiça social, delineando as bases em que irá moldar-se o perfil da nova sociedade portuguesa.
Na ordem externa, manteremos os nossos compromissos de natureza política, económica e militar, para os quais não há, de momento, outras razões limitativas senão as claramente decorrentes do circunstancialismo do momento que vivemos e da salvaguarda de riscos imediatos.
Entendo não dever ir mais longe nas minhas afirmações, pois a partir de amanhã o País terá à sua frente um Governo Provisório a quem será entregue a prossecução das tarefas que hão-de corporizar o ideal proclamado. Na verdade, se o Movimento das Forças Armadas libertou o Pais dos que agiam em seu nome mas sem mandato, não faria sentido que, ao ultrapassar o quadro traçado, voltássemos afinal ao mesmo sistema de decisões unilateralmente tomadas, embora sob outro rótulo e pela mão de outros poderes.
Nem se argumente que tais tarefas seriam legitimadas pela vontade do Povo expressa nas gigantescas demonstrações cívicas a que o País assistiu. Será bom recordar que os ditadores começaram sempre reformando à margem das instituições sob o eufórico aplauso popular. Foi aliás essa forma demagógica de transformar o Poder em tirania com o apoio das massas em delírio que esteve sempre na origem dos regimes totalitários. Ao contrário, o propósito que nos anima é o de criar a defender instituições democráticas estáveis, na serenidade de espírito com que devem tomar-se as decisões por que há-de reger-se um povo.
Competirão, portanto, ao Governo Provisório as tarefas administrativas necessárias à vida quotidiana que não pode parar, e a ingente missão de, a par da construção do bem-estar económico e social, edificar e consolidar a democracia através da qual o Povo Português encontrará a autêntica liberdade.
Terá de ser, assim, um Governo sem partidos, porque é de todos os partidos; sem tendências, porque nele cabem todas as tendências; sem programas, porque o seu programa é o do Movimento das Forças Armadas. É nesse sentido de eminência nacional que se enquadra; e a essa luz governará a Nação até que esta tenha ultimado quanto carece para governar-se a si própria, no pleno exercício da soberania que enfim se lhe devolve.
A realização desta gigantesca tarefa de preparação e de recuperação do País tem necessariamente de basear-se na estabilidade social e na expansão económica, impondo-nos serenidade cívica e a obrigação moral de uma total entrega ao trabalho intenso em todos os sectores da vida nacional.
Não podemos, de forma alguma, deixar que pressões de qualquer ordem venham perturbar o nosso processo de evolução; e à imagem do Portugal Renovado que estamos construindo teremos de associar a afirmação de plena capacidade para evoluir politicamente sem convulsão social nem quebra do ritmo da formação de riqueza que a todos aproveite. Daí justificar-se, mais do que nunca, o apelo ao trabalho no sentido de um aumento de produtividade, sendo esta, de momento, a mais instante das reivindicações; apelo, por isso, à consciência colectiva do operoso Povo Português que por certo não desejará a sua libertação ensombrada pelo espectro desolador de uma crise económica com todo o cortejo de privações e sob o signo do desemprego.
E tão-pouco será em clima de ódio cego e de obstinação vingativa sobre os responsáveis dos males passados que construiremos a imagem que há-de restituir-nos, perante o mundo, o lugar que nos cabe no contexto das Nações. Para tanto, impõe-se que sejamos coerentes e se entregue à isenção da Justiça o apuramento de responsabilidades pelos crimes e iniquidades cometidos à sombra do velho regime. E bem desejaria que, nesta hora de arranque para uma nova ordem, esse apelo à coerência encontrasse eco no espírito de todos os Portugueses, pois o Movimento das Forças Armadas triunfou para que as decisões arbitrárias e os anteriores métodos de repressão fossem banidos da vida nacional, e não para que houvesse apenas simples mudança de executores.
São estes os traços gerais da missão em que me empenharei durante o mandato que o Movimento das Forças Armadas me confiou. Tomo perante o Povo Português a responsabilidade do seu integral cumprimento; e faço-o de consciência tranquila, pois jamais a vida política se me revelou aliciante. Servirei o País com a mesma santa devoção com que sempre o servi, como soldado que me orgulho de ser; e desejo por isso concluir, com a afirmação de que a minha presença neste lugar deverá ser por todos entendida, antes de tudo e apenas, como firme e cabal garantia de que não serão traídas as esperanças despertas nos corações portugueses na manhã de 25 de Abril. Cumprida essa missão, e entregue o testemunho ao Presidente da República que o País livremente escolher, recolherei de novo ao seio das Forças Armadas de que nunca me afastei, e onde irei reintegrar-me com a consciência de ter cumprido o meu dever.
GALVÃO DE MELO ESTÁ ATENTO (INTERVENÇÃO NA RTP -27/5/74)
Com data de 22 de Maio, recebi uma carta que, embora dirigida à Junta de Salvação Nacional, vinha ao meu cuidado. Escrita por um só português, poderia ter sido escrita por todos os portugueses autênticos. Vale a pena torná-la conhecida. Por isso aqui estou. Ora escutai:
«À Junta de Salvação Nacional:
Aderi, desde a primeira hora, ao Movimento das Forças Armadas e ao programa da Junta de Salvação Nacional.
Não represento ninguém, senão eu próprio, mas, passadas quatro semanas sobre o 25 de Abril, começo a perguntar, e não obtenho resposta, se isto será a LIBERDADE que o Povo Português sonhava:
- Isto que é libertarem-se terroristas sem Pátria e transformá-los em heróis nacionais!
– Isto que é permitir-se e fomentar-se a «caça ao homem», o insulto gratuito, as ofensas corporais, saque de casas!
– Isto que é boicote de alguns, criado nas estações oficiais de rádio e televisão, com noticiários vergonhosos e impunemente parciais, em que os próprios locutores se permitem as atitudes mais impróprias, e nos martelam com programas e reportagens de nível baixo de todos os limites, não permitindo pôr a claro as meias verdades e as mentiras propagadas nas emissões que são pagas por todos nós; e tudo isto sem que nenhum locutor ainda tenha sido suspenso, como já teria acontecido em qualquer país civilizado!
– Isto que é permitir-se a ignóbil transcrição, em jornais que estão ao alcance de qualquer criança, do comunicado das prostitutas e dos homossexuais, numa demonstração de amoralidade sem precedentes em qualquer país em que a Família e a Moral existem ainda como valores!
– Isto tudo será a liberdade?
A resposta a isto tudo começam a dar os jornais estrangeiros, e bem insuspeitos, que já troçam e nos apontam como a Democracia Carnavalesca.
Em consciência, portanto, não podia deixar de me dirigir à Junta de Salvação Nacional e manifestar as minhas enormes apreensões pelo clima de anarquia que se vive e respira a todos os níveis e que está em total desacordo com a Liberdade responsável que o Movimento das Forças Armadas veio trazer aos portugueses da metrópole e do ultramar.
Por último, pergunto:
- Poderá o País aguentar a crise económica que dia a dia se vai desenhando diante de todos, com a paralisação da indústria e do comércio, com o aumento do desemprego, como consequência da falência inevitável de pequenas e médias empresas que soçobram perante exigências demagógicas de oportunistas, que se dizem representar o trabalhador honesto, o qual, na sua boa-fé, assim se deixa enganar por gente sem escrúpulos?
Que Deus guarde Portugal!»
Aqui termina a carta que foi escrita por um só português e poderia ter sido escrita por todos os portugueses autênticos que nesta hora me escutam.
Não vou comentar, em detalhe, a carta que acabei de vos ler: concordo com o autor nas suas preocupações fundamentais, e tanto me basta.
Portugueses:
No Mundo, existe um valor: o Homem.
Neste Homem devemos entender todos os homens: o ministro, que noite dentro cogita preocupado sobre o que será melhor para o povo que nele confia; e o cavador, que, de sol a sol, fecunda a terra com o esforço dos seus braços robustos. Ambos são dignos do nosso respeito e do nosso agradecimento... quando ambos cumprem até ao limite das capacidades com que os dotou a Natureza ou ulterior circunstância de acaso.
Foi para este Homem – para estes dois homens – que certa juventude militar, amadurecida no drama africano, se levantou cedo na madrugada de 25 de Abril e, unânime e decidida, abriu de par em par as portas da liberdade ao homem português:
- A liberdade de pensar e se instruir;
- A liberdade de criar ideias próprias e as discutir com o seu igual, o homem da cidade e o homem do campo, para, ambos, encontrarem a melhor ideia e a mais digna;
- A liberdade de todos os Portugueses escolher o que melhor for para todos os Portugueses.
É esta – e não outra - a Liberdade que a Junta de Salvação Nacional tomou a seu cargo respeitar e defender. É esta – e não outra – a Liberdade que a juventude heróica dos capitães depositou nas mãos experimentadas dos generais.
Estamos atentos, também nós, provavelmente antes de quaisquer outros, e breve nos demos conta do mau uso que se vem fazendo da Liberdade oferecida ao povo de Portugal, vai decorrido um mês.
É verdade que muita coisa nos desgosta, e quase espanta a ingratidão que é tão maltratar aquilo que com tanta emoção e dignidade foi oferecido!
Mas, talvez, o que se vê e ouve, tão contrário ao bem comum por que todos ansiávamos, seja apenas o gesticular grotesco, o vozear desafinado, de uns poucos que nunca pegaram na enxada para cavar o pão que comem por excesso ou jamais puderam conceber idades que mereçam a pena ouvir sem que no-las gritassem.
Também há os que nada querem senão o mal...
Teremos de os ensinar, usando de certa paciência e da firmeza necessária.
Porém – e é esta a nossa grande esperança e veemente desejo -, pode ser que o que se vê e ouve, tão contrário ao bem comum por que antes todos ansiávamos, não seja outra coisa que o despertar tumultuoso de um povo inocente que ousa os primeiros passos num caminho seu desconhecido: o longo e difícil caminho da Liberdade.
Esteja atento, mas tranquilo, o autor da carta; estejam atentos, mas tranquilos todos os Portugueses.
As Forças Armadas cometeram-se a missão de libertar o povo de Portugal.
Podem ficar com a certeza de que cumpriremos!
Somos homens de fé. Não abdicamos da causa começada.
SPÍNOLA NO PORTO (29/5/74)
É com profunda emoção que comungo do vosso contagiante entusiasmo. Não ides ouvir um discurso formal do Chefe de Estado mas apenas a voz de um Português verdadeiramente amante da sua Pátria, um Português como vós galvanizado pelo comum anseio de construir um Portugal Novo.
Um Portugal democrático, verdadeiramente livre e com mais justiça social. Um Portugal onde todos os Portugueses possam viver uma vida mais digna e mais feliz.
Mas esse Portugal livre por que todos ansiamos terá de ser edificado sob o signo da paz, da justiça e do trabalho.
Sem paz nos campos, nas fábricas, nas ruas e nos espíritos, sem o esforço conjunto de todos os Portugueses em ordem a aumentar a produtividade do trabalho, e sem justiça social traduzida numa equitativa distribuição do produto desse trabalho, jamais será possível construir o Portugal próspero do futuro – um Portugal onde a felicidade e o bem-estar não sejam apenas privilégio de alguns mas entrem livremente em todas as casas.
No dia 25 de Abril, as Forças Armadas restituíram a liberdade ao Povo Português. A partir de então acabaram os paternalismos de «elites» equívocas e o Povo pode expressar livremente, em diálogo aberto, os seus legítimos anseios.
Mas passado o primeiro mês de eufórico entusiasmo, é tempo de todos os Portugueses reflectirem que uma sociedade livre e democrática não é possível sem disciplina cívica e respeito mútuo. Para que a bandeira da Pátria seja efectivamente o símbolo da liberdade do seu povo, cada cidadão tem de respeitar a liberdade dos seus concidadãos, pois só num clima de recíproco respeito, na disciplina e na ordem poderemos consolidar a liberdade que as Forças Armadas nos ofereceram.
É tempo de cada Português meditar profundamente nos caminhos que pode tomar a partir de agora: o caminho da salvação do País ou o da sua ruína.
É tempo de todo o Português concluir por si mesmo que qualquer forma de anarquia acabará fatalmente por abrir a porta a novas ditaduras.
Daqui alerto todos os Portugueses de que as ideias democráticas e de liberdade que inspiraram o Movimento das Forças Armadas estão sendo sub-repticiamente minadas por forças contra-revolucionárias. Forças que se situam em diversos sectores da Nação e visam unicamente a destruição, a anarquia, o caos económico, o desemprego, na concretização prática da conhecida teoria da «terra queimada», para sobre a ruína económica e moral da Nação e utilizando como argamassa a nossa carne e o nosso sangue, construir algo de alheio ao País que todos sonhamos.
Eis a primeira grande opção que o Povo Português tem de fazer: a liberdade democrática ou o anarquismo. É chegada a altura de consolidar e reforçar a união do Povo com as Forças Armadas, combatendo em comum os inimigos da liberdade e da democracia, que pretendem por todas as formas opor-se ao rápido progresso económico do País – única via de nos anteciparmos à grave crise de desemprego e miséria para que criminosamente nos querem encaminhar as forcas da contra-revolução. E desejo reforçar este apelo à consciência do Povo Português com a garantia de que as Forças Armadas não deixarão trair a pureza dos princípios democráticos que inspiraram o Movimento de 25 de Abril; e se alguma vez forem obrigadas a responder à violência com a força fá-lo-ão sem hesitações, agora com a reforçada e legitimada autoridade de quem age em defesa da autêntica liberdade do Povo Português.
SPÍNOLA EM COIMBRA (31/5/74)
Foi com viva emoção que escutei as palavras de saudação do presidente da comissão administrativa da Câmara Municipal desta velha mas sempre jovem cidade de Coimbra. Palavras que calaram fundo no coração de um português, que, como qualquer de vós, partilha da mesma legítima aspiração a um Portugal livre e democrático.
É, portanto, como cidadão que me dirijo ao povo de Coimbra, cidade tão antiga como a Pátria. Povo que nasceu, vive e trabalha à sombra de pedras impregnadas de tradição de história. Povo cujo espírito se caldeou em clima de constante evocação dos grandes liberais aqui formados que rasgaram novos horizontes ao mundo do conhecimento. Povo orgulhoso da sua Universidade – pólo de irradiação cultural e ao mesmo tempo centro de ideias criadoras, que sempre situaram Coimbra em posição de vanguarda no pensamento e na acção.
Por isso a gente conimbricense foi sempre aberta a ideários progressistas, a que não é alheio o permanente convívio com os jovens intelectuais que hospeda, lídimos representantes daquela juventude saudavelmente irrequieta que com generosidade e entusiasmo alimenta o progresso das nações.
Foi neste clima de síntese do passado e do futuro, e neste ambiente misto de tradição e de modernidade, que a cidade de Coimbra se transformou num centro de difusão de cultura e em notável pólo vanguardista do desenvolvimento social e político da Nação.
Deverá ser essa a razão por que os conimbricenses tão bem souberam entender o espírito liberal que inspirou o Movimento das Forças Armadas.
E termino na segura convicção de que Coimbra saberá consolidar na ordem a liberdade conquistada, construir no trabalho produtivo a prosperidade da sua gente e da sua terra. Saberá também compreender que para reivindicar é preciso primeiro edificar, e que não poderá distribuir-se riqueza sem primeiro a produzir. Saberá, enfim, o povo de Coimbra fazer uso da liberdade que lhe foi restituída, liberdade que se encontra na mais profunda tradição desta cidade, em cujas Cortes aprendeu a não abdicar dos seus direitos, com a legitimidade de quem respeita voluntariamente o pacto social a que aderiu.
E ao agradecer-vos esta recepção, não posso deixar de manifestar o conforto que levo da certeza de que o povo de Coimbra saberá manter bem vivo o espírito do Portugal Novo nascido na madrugada de 25 de Abril – um Portugal democrático, verdadeiramente livre e com mais justiça social.
Viva Portugal!
SPÍNOLA DÁ POSSE AO CONSELHO DE ESTADO (31/5/74)
Acabam VV. Ex. as de ser empossados nas funções de Conselheiros de Estado, completando-se com este acto a estrutura política que presidirá ao País até à definição da nova lei fundamental.
Compõem o Conselho de Estado os membros da Junta de Salvação Nacional, alguns elementos preponderantes do Movimento das Forças Armadas e sete cidadãos de alta capacidade crítica e reconhecido esclarecimento. Não se me afigura necessário referir aqui as responsabilidades que sobre VV. Ex. as impendem, pois a sua dimensão encontra-se claramente expressa no diploma constitucional que delimita as funções deste órgão. Bastará apenas sublinhar que o âmbito das tarefas a que serão solicitados se situa no mais alto nível entre os mandatários da Nação, tendo-lhes sido atribuída competência que situa o Conselho de Estado na cúpula do presente quadro institucional.
Cumpre-nos, essencialmente, reconstruir uma Nação devolvida a si própria, o que exige uma total mobilização de capacidades e, acima de tudo, a mais constante e absoluta coerência com os princípios e objectivos do regime democrático que nos propusemos instituir.
Temos de reconhecer que uma Nação governada há meio século à margem da participação efectiva do povo constitui presa fácil de oportunismos políticos, sempre atentos a qualquer clivagem por onde possam infiltrar-se. E nunca será de mais denunciar quanto essas manobras são contrárias ao interesse geral, pois apenas visam através do caos obter o mando. Jamais interessou aos oportunistas o bem-estar dos povos; sempre se aliaram a quem pudesse facilitar-lhes o acesso ao poder mediante uma simples mudança de mão, aproveitando em seu benefício exclusivo todo o enfraquecimento da autoridade.
Tal risco agudiza-se entre nós pelas possibilidades da contra-revolução se infiltrar nos mais bem intencionados movimentos, desvirtuando-os e levando-os a exceder os limites do razoável e do possível, a promover a desordem cívica e por essa via operar o regresso ao passado que firmemente desejamos banir.
Não cabem nos sãos princípios democráticos imposições de vontade que não resultem de lei expressa, nem é democrática a intimidação de minorias nem a vida das sociedades à margem das leis. É neste contexto que se revela imperioso o reconhecimento de um poder moderador, que sendo de todos não se enfeude a ninguém e cujo papel é o de assegurar a protecção dos mais fracos contra a violação das suas consciências. É esse o poder que vos compete assumir. Teremos pois de empenhar-nos, por todos os meios, em ajudar os Portugueses a tomar imediata consciência de que a liberdade é, acima de tudo, o primado da lei em cuja feitura todos participam, jamais sendo possível na ausência da lei, e muito menos ainda quando entendida como a faculdade de cada um ditar a sua própria lei.
Para tanto, haverá que institucionalizar os partidos políticos como formas de expressão decorrentes do pensamento e da vontade da Nação. Mas seria bom que os partidos políticos fossem concebidos mais como associações de opinião do que como organizações enquadrantes de cidadãos espartilhados por políticas partidárias demasiado rígidas. E se as concepções totalitárias do Estado assentam sempre em partidos únicos, rigidamente estruturados, não fará sentido que os Portugueses celebrem a sua libertação sem atentar no risco de fundamentos menos reflectidos, acabando, nessa eventualidade, por aderir a organizações em tudo similares às que estiveram na origem de um regime cujo regresso nos negamos terminantemente a aceitar.
É tempo de cada português saber distinguir entre programas políticos autênticos e amontoados de bem orquestrados «slogans» demagógicos. Queremos, de facto, um País novo, cujos cidadãos se orgulhem de pertencer a uma sociedade aberta, constituída por seres pensantes, livres, capazes de debater em diálogo os problemas da sua comunidade, desde a família até ao conjunto da Nação.
Mas para que tal debate não redunde em factor de desagregação, impõe-se combater eficazmente todo o desvio da linha dos superiores interesses do País, neste caso traduzida na implantação de um regime democrático. De outra forma, estaríamos traindo as Forças Armadas e o próprio Povo, denegando à partida toda a possibilidade de construir o País que queremos ser.
Não creio, senhores conselheiros, que na presente conjuntura possa ser outro o quadro conceitual em que teremos de nos inserir. E porque do actual esquema político do País se irá passar para o regime que o Povo dentro de um ano referendar, a constituição do Conselho de Estado marca um patamar no processo de entrega de responsabilidades às instituições a quem foi dada a incumbência de preparar a reconversão nacional.
Termina, assim, a fase do pronunciamento militar com o retorno ao clima de legítima institucional idade que a Moral e o Direito impõem. E bem podem as Forças Armadas, ao completar a tarefa a que se comprometeram, sentir-se orgulhosas de haverem cumprido o seu dever. Dever que lhes impõe aturada vigilância e absoluta isenção, no respeito pelos princípios consagrados da ética militar, à luz dos quais lhes compete defender o País e o bem-estar dos seus cidadãos, sem, todavia, deter em seu nome o Poder senão pelo prazo indispensável à consolidação da ordem civil.
Nunca será de mais afirmar a dívida que gratidão da Pátria para com esses bravos obreiros do Movimento de 25 de Abril. B no momento «m que a sua tarefa se conclui, cumpre-me expressar o apreço da Nação por quantos souberam situar acima de pressões e conformismos os superiores interesses da grei.
Eis, senhores conselheiros, o enquadramento geral da alta missão que sem desfalecimentos nos compete cumprir, proporcionando ao País o desenvolvimento de um processo democrático, pautado no respeito pela vontade soberana do povo português.
Resta-me formular os mais sinceros votos pelo êxito da tarefa a que metemos ombros, e que se completará quando, dentro de um ano, pudermos passar de consciência tranquila o testemunho que o Movimento das Forças Armadas nos transmitiu.
SPÍNOLA EM TOMAR (3/6/74)
Discurso do Presidente da República, general António de Spínola em Tomar, em 3 de Junho de 1974:
Bom Povo de Tomar. Vivo convosco esta hora grande de entusiasmo, a hora de encontro com um Portugal renovado, a hora da democracia, da liberdade e da justiça social. Como primeiro servidor de uma nova sociedade portuguesa, já legitimada pela inequívoca adesão à liberdade que lhe foi restituída, cumpre-me o indeclinável dever de vos acautelar contra todos aqueles que, directa ou indirectamente, estão empenhados em minar o ideário democrático que presidiu ao Movimento das Forças Armadas.
Estamos a iniciar os primeiros passos no caminho da democratização, da justiça social, do trabalho e da paz. Mas haverá que distinguir, desde já, a verdadeira democracia das ideologias que, a coberto de um falso conceito de liberdade, nos podem conduzir a regimes políticos bem mais despóticos do que o derrubado em 25 de Abril.
É bom que o Povo Português se não deixe iludir pela jovem embriaguez dos vivos à liberdade e à democracia, que muitas vezes cria um ambiente propício à entrada da contra-revolução. Passado o clima emocional dos primeiros momentos, é chegada a hora de tomada da consciência colectiva do Povo Português. Pelo recolhimento da sua intimidade deverá reflectir friamente sobre a realidade económica do País em que vive sob a pena de caminhar para uma crise de desemprego com todo o seu dramático cortejo de privações e de misérias. É bom, portanto, que o Povo Português se não deixe atordoar pela liberdade que lhe foi devolvida, porque, se tal suceder, cedo ou tarde, outros lha virão roubar.
A verdadeira liberdade não consente intimidações ou violência para sermos livres, para concordar ou discordar, mas ninguém pode ser livre para violentar a consciência do seu semelhante. Queremos de facto um País livre, digno e ordeiro e não uma absurda democracia que nos leve ao caos. Queremos um Portugal próspero, prestigiado e ocupando o seu verdadeiro lugar no mundo. Aqui mesmo em Tomar o povo desta terra algumas vezes disse corajosamente «não» aos reis de Portugal. Mas hoje chegou o momento de o povo de Tomar dizer «não», desta vez àqueles que procuram sabotar o processo de democratização em curso. Temos de nos habituar a consolidar a liberdade conquistada. Escutemos, analisando, observando, criticando construtivamente, formando opiniões, mas acautelando-nos das manobras dos oportunistas, buscando se são viáveis as promessas falsas aliciantes ou se, pelo contrário, não passam de meros processos demagógicos utilizados para fins inconfessados.
A ambição humana, a ambição do poder é de todos os tempos e a consciência política dos cidadãos deve levar-nos a saber distinguir se outras correntes em presença, as que servem verdadeiramente o povo e os que apenas desejam servir-se dele para alcançar posições de mando.
É esta a consciência política que a pouco e pouco se impõe tomar. E ao sentir o calor do vosso acolhimento mais se me radica no espírito a convicção de que o Povo Português saberá escolher por si o que lhe serve repudiando a palavra vazia dos falsos arautos da liberdade. Bem hajam por esta hora alta de clara afirmação da indestrutível vontade de um povo que deseja conseguir a paz e sobretudo uma nação livre e digna.
SPÍNOLA NA OTA (10/6/74)
Força Aérea, aqui representada em todos os escalões e nas pessoas hoje condecoradas.
Não será formal o Presidente da República falar numa cerimónia deste tipo. Efectivamente não vos fala o Presidente da República. Fala-vos o militar, o soldado, o combatente. E nesta hora histórica e crítica que o País vive, reivindico, para além das funções que exerço, a minha qualidade de combatente. Foi, portanto, com viva emoção que ouvi as palavras que antecederam esta cerimónia: e não foi também sem profunda emoção que acabo de condecorar viúvas e filhos de camaradas, e, entre os vivos, os heróis hoje aqui consagrados.
As palavras que ouviram do representante do Movimento das Forças Armadas foram bem elucidativas. As Forças Armadas responderam, na manhã do dia 25 de Abril, aos políticos que as não souberam compreender, e que à sua sombra estavam conduzindo o País à desagregação e ao caos.
Não é altura de recordar o passado, no qual as Forças Armadas foram as grandes vítimas de uma política deficientemente orientada, ou melhor preconcebidamente orientada, no sentido do seu desprestígio, fazendo-as assumir as responsabilidades que não lhes cabiam. Por isso, bem-haja os jovens oficiais a que se ficou devendo o movimento de 25 de Abril. O movimento que, se por um lado libertou o País, restituindo-lhe a legitimidade do poder político, por outro, veio fazer justiça às Forças Armadas.
Hoje, o País vive uma nova era. Estamos no início da construção dum Portugal novo. A nós, Forças Armadas, compete-nos permanecer vigilantes, atentos, para que o passado não volte e para que jamais alguém tenha a veleidade de novamente nos imolar em benefício de interesses políticos
Em todos os tempos, nas horas críticas, a Pátria sempre se encontrou naqueles que o povo elegeu como sendo os melhores – os homens de carácter, os valentes, os bravos. Estamos presentemente, empregando todos os nossos esforços para que a paz volte ao Ultramar. Mas estes anos de guerra tiveram um mérito: revelar de entre todos os melhores, sempre tão necessários nos momentos difíceis da vida das pátrias.
Era isto que aqui vos queria dizer, nesta hora confusa, nesta hora mista em que a tradição competia com o autêntico patriotismo. Nesta hora histórica, hora em que se abrem amplos horizontes a uma vida melhor para a nossa Pátria, mas em que é preciso falar bem claro para que não sejam traídos os legítimos anseios do bom povo português, em que se inspirou o Movimento das Forças Armadas ao longo de treze anos de luta no Ultramar. Longo período em que mais do que a retaguarda, mais do que alguns daqueles que arvoram dísticos e fazem manifestações, elas foram a grande vítima.
É esta a palavra de gratidão que a Pátria deve às Forças Armadas nesta hora, e é esta palavra de gratidão que neste momento, para além do militar, do soldado, do combatente que sou, o Presidente da República aqui vos veio trazer.»
SPÍNOLA EM TANCOS (2/8/74)
Conhecemo-nos bem. Estão aqui presentes muitos oficiais, sargentos e soldados pára-quedistas que me conhecem das horas boas e das horas más, das horas de construção do progresso das terras do ultramar e das horas em que à guerra tivemos de responder com a guerra.
Para alguns de vós, é o seu velho comandante-chefe que lhes fala, animado pelo mesmo patriotismo de sempre e a mesma firme determinação. Por isso vos trago uma palavra de confiança e de calma – aquela calma e confiança que um combatente pode manter, pois sabe que não cede e que, conscientemente, joga a sua vida pela Pátria.
Acabastes de ouvir as palavras do vosso comandante, que foram palavras de um português e de um militar, definindo bem os objectivos de 25 de Abril. Seremos fiéis à linha do Movimento e à pureza dos seus princípios. Ouvistes há dias a minha comunicação ao País, na hora histórica em que nos encontramos com nós próprios, demonstrando inequivocamente a sinceridade e a autenticidade de uma política. As palavras do vosso comandante, ao descrever uma passagem da sua comissão na Guiné, demonstram que aquela comunicação representou, efectivamente, a cúpula de uma linha coerente de pensamento.
Não é na demolição sistemática, não é na constante agressão ideológica, não é fomentando ódios, não é ofendendo gravemente as Forças Armadas e pondo em causa princípios consagrados da ética militar que se constrói o futuro. Mas podeis ter confiança. O Chefe Supremo das Forças Armadas é o mesmo de sempre e não se desviará da sua ética militar, que se afinal, a ética da Pátria. Não suportaremos que algum português duvide das intenções das Forças Armadas. Foram elas que se bateram no ultramar e que fizeram o 25 de Abril; e continuarão hoje a defender a Pátria com a mesma determinação.
Encaro o futuro do País com calma e com verdadeira confiança; e essa confiança assenta fundamentalmente no alto sentido de patriotismo das Forças Armadas, onde situo, entre os melhores, o Regimento de Pára-Quedistas. Nunca virastes a cara nas horas de perigo; e é com homens como vós que se constroem as pátrias. Assim como construímos no ultramar, nos últimos anos, algo de que nos podemos legitimamente orgulhar, assim assumimos, no 25 de Abril, a responsabilidade plena de construir uma mãe – pátria melhor e com mais justiça social. Formulo votos para que o futuro que estamos edificando seja digno de vós.
A JUNTA AMEAÇA (4/8/74)
O Programa do Movimento das Forças Armadas, de cuja execução a Junta de Salvação Nacional é constitucionalmente garante, impõe o respeito rigoroso da lei, pois o regime democrático que se propõe Instituir no País não pode construir-se se as instituições forem desrespeitadas e postergados os direitos e os deveres dos cidadãos.
Alguns elementos, agrupados em movimentos políticos extremistas ou agindo individualmente, têm vindo a desencadear acções que visam desacreditar as Forças Armadas e minar as Instituições políticas, com o objectivo de impedir o desenvolvimento do processo de democratização da vida política do País.
Estas acções, que têm deparado com a sentida oposição do povo português, não podem deixar de ser consideradas como crime de lesa - liberdade e lesa - democracia e, como tal, aqueles movimentos revelam-se declaradamente contra o espírito do Programa do Movimento das Forças Armadas.
Assim, todos os que actuarem criminosamente em concreta agressão ideológica às Forças Armadas, ou aos princípios proclamados pelo seu Movimento, quer através de meios escritos, quer em reuniões ou manifestações públicas, serão rigorosamente punidos.
A RENÚNCIA DE SPÍNOLA (30/9/74)
A crescente deterioração do clima social, económico e político, ultimamente mais acentuada, tem constituído, para mim, motivo de mais funda preocupação. Sobre as origens da situação a que chegamos me tenho debruçado num esforço de análise que sempre se orientou pela pureza dos princípios que informaram o espírito do 25 de Abril. Esforço de análise a que me obrigaram a minha consciência de português e a minha responsabilidade de Presidente da República, pois assumi, perante o País o compromisso de responder pela restauração das liberdades cívicas e pela construção de uma democracia Institucional autêntica. E nessa tarefa me empenhei com sinceridade inequívoca e férrea determinação.
É dessa análise e da posição que assumo com base nas conclusões alcançadas, que desejo informar o Conselho de Estado e o País, para que sobre elas se não teçam interpretações inexactas, nem se deturpe a honestidade das intenções que lhes presidiram.
Começarei por afirmar que não é de hoje nem de ontem a minha adesão ao espírito do Movimento das Forças Armadas. Desde a nomeação para o cargo de governador da Guiné que sempre expus frontalmente, primeiro sem publicidade por dever de ética, e depois publicamente, a minha total oposição ao ideário e aos métodos do velho regime. E isso sem rodeios nem eufemismo, antes falando a rude linguagem da verdade que, como soldado e como combatente, jamais deixei de utilizar.»
Estive com o Movimento desde a primeira hora, pelo que conheço perfeitamente o seu espírito e as suas intenções, a que aderi com uma sinceridade de que ninguém ousará duvidar. E são exactamente esse conhecimento e essa identificação que me conferem irrecusável autoridade moral para concluir que a origem da situação a que chegámos reside na desvirtuação do ideário do Movimento. Encontro-me perante a evidência de o Programa do Movimento das Forças Armadas estar a evoluir no quadro de uma acção política tendente, afinal, à sua própria neutralização, em verdadeiro clima de inversão de uma moral cívica à margem da qual se torna impossível a prática da democracia e da liberdade. Inversão em que, por fidelidade ao espírito do Movimento e pelo respeito aos compromissos que assumi ao aceitar este cargo, não devo nem posso, participar. Dois ou três pontos bastarão para o justificar.
Esteve no espírito do Movimento das Forças Armadas definir, concreta e objectivamente, uma política ultramarina que conduzisse à paz entre os portugueses de todas as raças e credos, objectivo que o anterior regime se revelou totalmente incapaz de atingir. Essa política definimo-la nós, ao estabelecer inequivocamente e com geral aceitação os princípios programáticos do processo de descolonização que o mundo e os homens de sã consciência reconheceram válidos. Toda essa política e o consequente processo de descolonização foram deturpados, numa intenção deliberada de os substituir por medidas antidemocráticas e lesivas dos reais interesses das populações africanas.
Esteve igualmente no espírito do Movimento das Forças Armadas promover a harmonia entre todos os credos políticos. Mas, essa harmonia jamais será possível quando, por um lado, os chefes declarados de alguns partidos políticos fazem apelo ao bom senso, e por outro lado os respectivos grupos de acção enveredam pela via de coacção psicológica através dos grandes meios de informação, e até da violência, em flagrante negação da liberdade e a pretexto da insinuação caluniosa logo lançada sobre os seus oponentes.
Esteve no espírito do Movimento das Forças Armadas reservar à Nação, através das suas legítimas instituições democráticas, a definição do perfil da sociedade que os Portugueses desejam construir. Mas esse princípio encontra-se claramente ameaçado, senão já de todo comprometido, pela sistemática cedência perante a realização larvar das reformas de fundo, que dia a dia se vão operando face ao clima vigente de ausência de lei.
Daí resulta que, no fim deste longo período de anemia, a Nação Portuguesa se encontrará perante situações irreversíveis, fortemente limitativas do estatuto constitucional que vier a ser escolhido em consenso popular. Tais situações estão, desse modo, retirando ao povo a sua real capacidade para o exercício da soberania.
O Programa do Movimento previa também que a substituição do regime deposto teria de processar-se sem convulsões internas que afectassem a paz, o progresso e o bem-estar do Povo Português. A situação é, infelizmente, bem diferente. Forjam-se reivindicações, postas nas mãos dos trabalhadores por burgueses frustrados do velho regime, subitamente titulados também de trabalhadores. A paz, o progresso e o bem-estar da Nação são comprometidos pela crise económica para que caminhamos aceleradamente, pelo desemprego, pela inflação incontrolada, pela quebra no comércio, pela retracção dos investimentos e pela ineficácia do poder central. Isto porque quanto se vem fazendo à sombra do Programa do Movimento das Forças Armadas pouco menos é do que o assalto aos meios de produção. É a reivindicação com base em decisões tomadas a níveis sem competência nem legitimidade para o fazer; enfim, é a inversão das estruturas, à margem da sanção democrática do povo. Anulam-se as leis do velho regime antes que novas leis regulem a vida política, social e económica do país e mesmo algumas das leis já publicadas são impunemente escarnecidas. Neste clima generalizado de anarquia em que cada um dita a sua própria lei, a crise e o caos são inevitáveis, em flagrantes contradições com os propósitos do Movimento. Por várias vezes chamei a atenção do País para as consequências a que tal estado de coisas acabaria por conduzir; e após profunda e demorada reflexão tomei nítida consciência de não estarmos a caminhar para o país novo que os Portugueses desejam construir.
Conclui assim ser inviável a construção da democracia sobre este assalto sistemático aos alicerces das estruturas e instituições por grupos políticos cuja essência ideológica ofende o mais elementar conceito de liberdade, em flagrante desvirtuação do espírito do 25 de Abril. Encontro-me, portanto, perante a impossibilidade de execução fiel ao Programa do Movimento das Forças Armadas, o meu sentido de lealdade inibe-me de trair o povo a que pertenço e para o qual, sob a bandeira de uma falsa liberdade, se estão preparando novas formas de escravidão.
Tenho dedicado toda a minha vida ao serviço da Pátria e não desejo que fique a pesar-me na consciência haver alguma vez traído aos meus concidadãos. Nestas condições, e perante a total impossibilidade de, no actual clima, se construir uma democracia autêntica ao serviço da paz e do progresso do País, renuncio ao cargo de Presidente da República.
Ao dirigir ao Conselho de Estado e ao Povo Português esta mensagem de renúncia, desejo reafirmar a minha indestrutível vinculação aos ideais da liberdade e da democracia e a minha inabalável obediência a princípios básicos de ética militar, que me inibe de participar em projectadas estruturas revolucionárias. E no momento em que, uma vez mais, o País está na iminência de ver esses ideais comprometidos, lanço o meu último apelo para que cada português conserve a necessária serenidade de espírito, se mantenha em paz, confie na força do voto secreto, a grande arma democrática dos homens ordeiros e livres, e jamais consinta que a sua consciência seja violada.
Termino formulando os mais ardentes votos para que a causa da liberdade e da democracia triunfe de facto sobre quantos dela se vêem apenas servindo. E levo comigo o conforto da certeza de tudo haver feito para manter intacto o espírito do 25 de Abril, do qual me constitui intransigente defensor e garante.
«O M. F. A. NÃO TEM PARTIDO» (6/11/74)
Tendo surgido ultimamente algumas referências susceptíveis de interpretações incorrectas sobre a ligação do M. F. A. com partidos ou movimentas políticos, a Comissão Coordenadora do Programa do M. F. A., através da 5,a.ª Divisão do BE. M. G. F. A., esclarece:
O M. F. A. fez uma revolução para derrubar o fascismo, devendo, portanto, a sua orientação ser considerada na linha progressista.
A À esquerda do fascismo (fórmula política do desespero para garantir a manutenção do capital monopolista) situa-se um leque de possíveis soluções todas eivadas em maior ou menor grau de tendências socialistas. São elas que representam o sentido progressista dia revolução, pois baseiam-se no reconhecimento de que o Estado terá de intervir para garantir o caminho da maior justiça social.
O M. F. A. não tem partido político, nem é um partido político.
O M. F. A., interpretando a vontade da esmagadora maioria dos portugueses, dinamiza as Forças Armadas que nele se vão transformando, polariza todas as forças democráticas e exige o cumprimento do programa que apresentou à Nação.
O M. F. A. encontra-se acima dos partidos políticos, aceitando todos os que se não oponham ao seu programa. Unido com o povo, assegura a instauração de uma autêntica democracia pluralista em Portugal.
O M. F. A. encontra-se atento relativamente àqueles que, camuflada mente, fazem o jogo da reacção, e combate, vigorosamente, todas as formas de sabotagem da ordem pré-democrática estabelecida.
O M. F. A. não se encontra comprometido com qualquer movimento político.
Acolhe e incentiva as forças antifascistas, mas não se vincula a nenhuma delas, porquanto são múltiplas as formas de expressão democrática e todas são necessárias e devem existir, traduzindo a variedade das opiniões e a prática das liberdades.
Costas GOMES ANUNCIA A DATA DAS ELEIÇÕES (11/2/75) As eleições para a Assembleia
Constituinte realizar-se-ão no dia 12 de Abril de 1975.
Proclamo publicamente esta data cumprindo os termos do n.º 6, art. 7 ° da Lei n.º 3/74.
Convém recordar que nas grandes linhas do Programa do MFA, descolonizar e democratizar eram as generosas motivações de homens corajosos que não dormiram a noite de 25 de Abril.
Ninguém tem dúvidas quanto aos passos fundamentais percorridos na descolonização, nessa ronda inevitável dos caminhos da História; ronda que se aproxima de um epílogo original, genuinamente português.
Pois bem, no caminhar para a Democracia a data que hoje fixei será um marco fundamental na longa rota a percorrer.
Estas primeiras eleições acabarão por determinar os homens a quem compete a transcendente responsabilidade de preparar a Constituição, a Lei fundamental que lançará o povo a que pertencemos no rumo do futuro.
Votar é um direito de todo o eleitor mas é simultaneamente um dever imperioso. Nenhum português se negará à responsabilidade de votar, de votar tão conscientemente quanto lhe seja possível.
Votar é colaborar, não votar é trair o Povo.
Aproveito a oportunidade de hoje para fazer um balanço geral dos resultados de menos de um ano da nossa Revolução.
Começarei por reconhecer tantos erros e desvios individuais e colectivos feitos por homens e organizações egoisticamente agarrados a velhos privilégios; por oportunismo pseudo – revolucionários de ambiciosos do Poder; por massas populares, gente simples e boa, que interesses ocultos polarizam e manejam.
Estamos a aprender esforçadamente a viver em liberdade. Decretos não bastam.
A vivência em sociedade livre terá de impregnar os sentimentos, as atitudes e os comportamentos de todos nós; teremos de a conquistar, integrá-la na nossa personalidade colectiva num processo não isento de vários sobressaltos.
Evitaremos as ditaduras que marginam a rota revolucionária que prosseguimos.
Aos homens sem fé, aos fracos de vontade e de espírito, aos que desertam na caminhada, batidos pelas dificuldades da Revolução, aos feridos nos privilégios, aos impacientes, aos injustamente traumatizados, a todos recomendaria a leitura da história de tantas revoluções libertadoras.
A caminhada para a liberdade tem sempre um preço social em suor, sangue e lágrimas; só a generosidade dos autênticos revolucionários e a bondade e civismo do Povo Português tem permitido preço social tão baixo.
Todos nós, Povo de Portugal, vamos lutar mais com o espírito, trabalhar mais com as mãos, perseverando mais com a vontade, para construir uma sociedade livre com um mínimo de sofrimentos injustos.
Chegam até mim clamores de impacientes e de idealistas, portugueses que criticam o que chamam "ritmo lento da nossa Revolução". Falam-me outros, nos quais incluo estadistas estrangeiros que conduziram as suas revoluções libertadoras, do perigo da aceleração excessiva do processo revolucionário.
A extrema dependência económica de um mundo em crise, a tarefa urgente da descolonização, o artificialismo do sistema das forças de produção, o atraso e distorção educacional, são algumas das pesadas heranças que limitam a capacidade de aceleração revolucionária, sob pena de rotura do equilíbrio social que desejaríamos manter.
É reconfortante verificar quanto se fez em menos de um ano de Revolução.
Milhões de almas, povos irmãos, foram colocados no caminho descolonizante, génese de novas pátrias de expressão lusíada.
O Povo Português, intoxicado de decénios de propaganda da extrema-direita, dispõe agora de uma informação pública com órgãos livres, onde já se procura criar o justo equilíbrio no pluralismo de opiniões.
Os responsáveis pela Economia e Finanças criaram uma estrutura orçamental mais adequada, uma distribuição mais justa da carga fiscal, aumentaram o «controle» do Estado sobre a banca e a economia privada e preparam-se para actuar na conjuntura com base no novo Plano Económico já aprovado.
Iniciaram-se as intervenções do Estado nas empresas privadas e na implantação da reforma agrária.
Os sectores eléctricos, petrolíferos, siderúrgicos, comércio internacional, distribuição cooperativa dos bens de consumo, construção de navios de pesca, e outros sectores começam já a sentir a nova orientação do Estado para os desviar de interesses capitalistas exclusivos e os colocar ao serviço do Povo.
No plano da Administração Interna tentam-se soluções de democratização e descentralização administrativa e mantém-se firme o rumo pré-eleitoral cheio de dificuldades.
Na política externa, a colaboração na descolonização, o reajustamento e alargamento das nossas relações internacionais tem sido uma tarefa imensa a protelar uma exploração internacional mais intensa da nova situação nacional. A renegociação da Concordata e do acordo dos Açores são já vantagens fundamentais a considerar em curto prazo.
Tudo o que se refere a transportes internos, marítimos e aéreos está em plena reconversão, bem como o problema habitacional, a utilização da energia, as obras públicas e a defesa do ambiente.
Nunca se trabalhou tão intensamente nos problemas de segurança nacional dos trabalhadores, onde se estão a criar ou melhorar esquemas de protecção contra a doença, o acidente, o desemprego e a velhice.
Nas relações capital/trabalho procura-se orientar uma turbulência excessiva, limitar aventuras pseudo – revolucionárias, mas importa sobretudo continuar a reforçar a luta ordeira mas firme dos trabalhadores que trabalham e por isso conquistam legítimos direitos a uma vida melhor e mais digna.
No campo da educação nacional tudo o que foi feito, incluindo a democratização da gestão dos estabelecimentos de ensino, a revisão dos programas primários, preparatórios e secundários, os acordos culturais, o trabalho de planeamento e preparação, parece não impressionar.
É um esforço camuflado pela selva imensa do que está por fazer, tarefa intrinsecamente gigantesca agravada por correntes extremistas de pensamento, por fascistas ou pseudo – revolucionários a quem Portugal Livre parece não convir.
Pensemos ainda no que se realizou ou preparou no campo da saúde, em medicina preventiva, em democratização do sistema hospitalar, em regularização das carreiras profissionais.
Gostaríamos de ter realizado mais e melhor, mas façamos justiça aos actuais responsáveis do Poder, trabalhadores infatigáveis que merecem alta cotação no mundo do trabalho honesto com que teremos de forjar um País democrático, autenticamente livre e justo.
Em termos fatalmente genéricos defini os eixos por onde avança a nossa Revolução, com o impulso e a segurança social na mão dos homens do M. F. A., das forças autenticamente democráticas e, sobretudo, do Povo ide Portugal.
Aos timoratos, aos privilegiados do anterior regime, a todos quantos agora se deixam entrar em ressonância com a descrença ou o alarmismo recomendaria mais coragem e vontade de colaborar no futuro das classes mais desfavorecidas sem pensar tanto na tranquilidade e no conforto próprio.
Aos ultopistas, aos vendedores de ilusões, aos cultivadores do ódio e da violência, aos vingativos, aos nefastos manipuladores da opinião pública recomendaria um exame de consciência e uma nova atitude face a um Povo que quer ser livre, trabalhar mais e distribuir melhor a riqueza produzida.
No Portugal novo irão caber todos os homens justos, trabalhadores de recta intenção.
Cabe agora, que vamos realizar as primeira eleições, chamar a atenção aos que, em palavras e escritos, se dirigem aos responsáveis do Poder exigindo medidas autocráticas para grandes e pequenos males que detectam ou julgam vislumbrar.
Estamos num Portugal novo; o poder autocrático e individual não voltará. O poder é e será exercido por órgãos colectivos emergentes de um sistema de forças democráticas. Haveremos de aceitar pequenos inconvenientes nas grandes vantagens da democracia pluralista em construção.
Terminarei com dois apelos. O primeiro quero dirigi-lo aos partidos autênticos, aqueles que verdadeiramente são representativos de segmentos genuínos do Povo de Portugal.
A felicidade possível de todos nós depende muito da vossa acção esclarecedora e pedagógica junto das massas populares. Intensificai tudo quanto contribua para a unidade no sentido de se construir uma democracia pluralista e livre e procurai esquecer os atritos possíveis na luta política.
Neste momento a hora é de construção de um sistema em que caibam todos os partidos autênticos; mais tarde, numa sociedade mais politizada, sendo livres sempre poderemos corrigir as posições relativas que justamente caibam a cada doutrina partidária.
Cordialidade, generosidade e lealdade na luta são atributos dos verdadeiros combatentes da liberdade.
O segundo apelo dirige a todos os eleitores. Votai, mas votai com consciência; não nos envergonhará a falta de cultura política porque até essa sempre nos foi negada e escamoteada.
Teremos agora de dialogar, escutar, ler, falar, estudar os programas partidários, treinar o nosso espírito crítico para obter uma escolha consciente e válida.
Não vejamos fantasmas nos arautos da liberdade, mas não aceitemos a ilusão dos fogos-fátuos, belos mas estéreis, de utopias totalitárias.
Sobretudo rejeitemos partidos ou doutrinas que oferecem para já a violência e o ódio em troca de um suposto paraíso futuro a que tal caminho jamais conduziria.
Saúdo o 12 de Abril de 1975, que prevejo padrão luminoso no avanço revolucionário que conduzirá à Democracia pluralista livre e autêntica.
Saúdo todos os eleitores que votem conscientemente em partidos válidos para a Revolução Portuguesa.
Vamos contribuir com o nosso voto para se obter uma Constituição que nos garanta um futuro em Liberdade, fraternidade, progresso e justiça social.
O SOCIALISMO É TAREFA DOS TRABALHADORES (COMUNICADO DO CONSELHO DA REVOLUÇÃO - 19/4/75)
O Conselho da Revolução apreciou a situação da economia na actual fase do processo revolucionário português, verificando, designadamente, a deficiente utilização da capacidade produtiva do País em recursos humanos e materiais, acompanhada da redução do nível de investimento, o crescente desequilíbrio da balança de pagamento e a persistência da pressão inflacionista, embora em atenuação nos últimos meses.
Tal situação é consequência natural do desenvolvimento dum processo revolucionário que tem vindo a desmantelar o poder do capital monopolista, agravada pela reacção dos seus detentores, que a todo o custo têm tentado impedir a perda dos seus privilégios.
Vivemos assim uma crise largamente resultante não só das estruturas económicas do fascismo e colonialismo como da desagregação do sistema capitalista em Portugal. Ë agora necessário e imperioso reconstruir a economia por uma via de transição para o socialismo. Está em causa consolidar os primeiros concretos da nossa revolução socialista e realizar novos avanços nessa direcção, atendendo a dois objectivos primordiais:
Garantir a independência nacional no arranque para um socialismo verdadeiramente português, evitando situações extremas de crise económica que nos coloquem em reforçadas e delicadas dependências externas; e identificar a dinâmica da classe trabalhadora com um projecto de construção do socialismo.
O Conselho da Revolução analisou os trabalhos em curso no âmbito do Conselho Económico relativo à preparação dos programas de medidas económicas de emergência, tendo definido as seguintes orientações gerais:
- É necessário que os trabalhadores sintam que a economia já não lhes é estranha, ou seja, que a construção socialista da economia é tarefa deles e para eles. Isto implica a afirmação clara do princípio de controlo organizado de produção pelos trabalhadores para objectivos de produção e eficiência coordenados pelos órgãos centrais de planeamento segundo esquemas a definir com brevidade.
- É indispensável estabelecer uma limitação dos consumos a partir dum princípio de máximo nacional de rendimento disponível extensível aos titulares de todos os rendimentos e não apenas ao trabalho por conta de outrem
- Igualmente se torna indispensável garantir a contenção dos preços de bens essenciais,sobretudo alimentares.
- Deverão ser completados os passos já dados no sentido da nacionalização dos sectores básicos de actividade económica (indústria, transportes e comunicações).
- Deverá ser aplicado um programa progressivo de reforma agrária integrado num todo coerente de medidas de política económica.
- Verificadas as condições anteriores, será legítimo fazer apelo à mobilização dos trabalhadores para o emprego produtivo, mobilização necessária à construção da sociedade desejada pelo povo português.
As posições definidas na reunião de ontem do Conselho da Revolução, a efectivarem-se num breve prazo, traduzir-se-ão em passos no arranque para uma via socialista já apontada pelas vanguardas do povo e também na última Assembleia do M. F. A., onde além de oficiais participaram sargentos e praças.
Os esforços desenvolvidos desde o aberto comprometimento do M. P. A. com a via que abrira em 25 de Abril têm até agora dado resultados limitados, embora particularmente vivos cada vez que se responde aos ataques da reacção (nomeadamente após o 28 de Setembro e o 11 de Março). Esses esforços tiveram reflexo nomeadamente no último relatório da Organização da Coordenação e Desenvolvimento Económico, segundo a qual Portugal foi um dos países onde a taxa de inflação baixou em relação a períodos anteriores, pese embora seja ainda muito alto o ritmo de aumento de preços.
É ainda no sentido de diminuir a inflação que se devem compreender as linhas gerais agora definidas. E elas são coerentes.
A inflação é, no fundo, o aumento sucessivo de preços que tanto preocupa e desmoraliza os trabalhadores, que vêem os seus melhores salários desaparecerem, ultrapassados pelos preços de mercado. Ela é, por outro lado, resultado das diferenças entre os meios de consumo e os de produção, quando os primeiros pressionam o aumento de preços sempre que não existe aumento de produção.
Um efectivo meio de combate à inflação é a limitação do consumo e o aumento de produção, equilíbrio que se consegue através da acentuação de um dos factores de equilíbrio: o da produção à custa dos trabalhadores e do consumo à custa dos privilegiados.
Esta base é essencialmente para compreender a definição das várias linhas de arranque para o socialismo agora feita pelo Conselho da Revolução, nomeadamente quando se refere «limitação dos consumos a partir de um princípio máximo nacional de rendimento disponível extensível aos titulares de todos os rendimentos e não apenas dos empregados», isto é, vai atacar-se realmente os exploradores, que, nada fazendo, vivem dos rendimentos do trabalho de outros, e já não haverá apenas um equilíbrio entre os privilegiados e as classes desfavorecidas.
Com estas e outras medidas, como nacionalização de actividade económica, contenção dos preços essenciais, reforma agrária, o Conselho da Revolução espera legitimamente conseguir a mobilização dos trabalhadores, tão necessária à construção da sociedade desejada pelo povo português
ASSEMBLEIA DO M. F. A. DA ARMADA DEFENDE SISTEMA PLURIPARTIDÁRIO
PARA O SOCIALISMO (19-4-75)
A nova Assembleia do M. F. A. da Armada, constituída por oficiais, sargentos e praças, reunida em 19 de Abril de 1975, declara que orientará as suas actividades segundo os princípios já emanados do Conselho da Revolução em especial: Reconhecimento do carácter socialista da revolução portuguesa, entendendo-se como tal o caminho firme no sentido de passagem capitalista para a colectivização dos meios de produção terminando com a exploração do homem pelo homem.
Na ordem política interna, a constituição de um sistema pluripartidário formado pelas forças políticas verdadeiramente interessadas na revolução socialista de forma a garantir a construção do socialismo, a defesa eficaz do processo revolucionário e as liberdades democráticas.
Na ordem política externa, a garantia de uma total independência nacional, de acordo com os princípios de não ingerência nos assuntos internos das nações e de uma ampla solidariedade com todos os povos do mundo, em particular com os de língua portuguesa.
Na Armada, seu fortalecimento no sentido de sua inteira colocação ao serviço dos interesses da grande maioria do povo português, tornando consequente a aliança povo M. F. A. e sua democratização na construção de uma disciplina consciente e revolucionária baseada na igualdade de oportunidades de aceso e na hierarquia da competência.
COSTA GOMES ENCERRA A CAMPANHA ELEITORAL (24/4/75)
No eterno devir da História, poucas horas caíram sobre o encerramento da primeira campanha eleitoral do Portugal novo, mais independente e mais livre.
Entrámos no período que a lei e o bom-senso destinam à meditação dos eleitores na antecâmara de uma transcendente decisão. Vamos escolher e votar no partido que a consciência nos indique como o mais apto a intervir no futuro do povo que somos.
«Procurarei integrar-me bem nos objectivos do MFA ao cumprir a minha missão de dirigir uma palavra amiga ao povo a que orgulhosamente pertenço.
Desempenharemos todos amanhã o acto decisivo do esquema eleitoral, a colocação nas urnas do nosso boletim de voto.
Sobre o valor deste acto da vontade, temos ouvido opiniões variáveis, desde um extremismo de o considerar supérfluo e nefasto, ao outro extremismo de o considerar como essência de todo o pensamento e teorização da ciência política.
No estádio actual da civilização humana, a vontade popular é a verdadeira fonte do poder político.
A determinação desta vontade colectiva, quando feita por um esquema eleitoral, como toda a obra humana, incorpora alguns defeitos, a par de muitas virtudes e certezas.
Hipertrofiando uns ou outras, é possível construir raciocínios que condenem ou sacralizem a aplicação de um sistema eleitoral.
Seja como for, dentro dos actuais conceitos da ciência política, as soluções eleitorais são aquelas que melhor garantem a definição da vontade popular e, quando pluralistas, têm a altíssima vantagem de garantirem permanentes ratificações ou correcções.
Acreditamos sinceramente que, ao escolher esta via de análise, democrática e pluralista, o MFA ofereceu a melhor das soluções possíveis ao seu representado e aliado, o povo de Portugal.
Considerada indiscutível esta solução, façamos todo o balanço da importante fase já concluída, a campanha eleitoral, onde o povo e os partidos desempenharam os papéis fundamentais.
Não nos alarmemos com certos desvios a que gente simples e boa se deixou conduzir por agitadores pseudo – revolucionários e reaccionários de extremismos opostos. Em termos gerais, com saldo altamente positivo, o povo demonstrou elevado civismo e suficiente politização para desarmar intelectuais paternalistas, observadores pessimistas e os arautos das convulsões sociais.
O povo mereceu um voto de confiança no futuro.
Quanto aos partidos, não generalizemos culpabilidades esquemáticas. Havemos de colocar fora da análise os utopistas, os cultivadores do ódio e da violência, manipuladores do substrato inferior do inconsciente colectivo.
Considerando apenas os partidos autênticos, resolvemos as poucas atitudes discutíveis para sublinhar o amplo contributo dos esforços sérios de acção didáctica e esclarecimento democrático que souberam realizar.
Mereceram um voto de esperança na democracia pluralista do socialismo português em gestão.
Fechemos aqui o balanço do passado próximo e reportemo-nos ao futuro imediato, o exercício do voto no dia memorável de 25 de Abril de 1975.
Votar é um dever de consciência, votar conscientemente é um dever nacional.
Procuraremos todos com afinco estudar a decisão final, se ainda não a tivermos feito, com a certeza de que o essencial é exactamente esse esforço de procura, essa decisão como acto último da vontade política de um povo que quer ser livre.
Nas grandes crises políticas da nação, o povo português sempre decidiu com uma consciência intuitiva, que ultrapassou em validade a consciência racionalista de elites amolecidas.
Eu acredito no progressismo empírico do povo que somos. Escolheremos entre os partidos autênticos que não barram a via socialista e que nos prometeram o pluralismo essencial ao exercício da liberdade.
Ao terminar, considerada indiscutível a necessidade de votar, desejo sublinhar também a extraordinária importância de que este 25 de Abril seja um dia onde imperem a ordem e a serenidade característica do povo português.
No plano nacional, o clima tranquilo, afastará fantasmas ideológicos; muitos privilegiados do antigo regime temem menos os prejuízos materiais do que os indefinidos terrores políticos que a ditadura inculcou no seu inconsciente colectivo.
No plano externo, o civismo calmo que todos esperamos recordará ao Mundo que meio século de ditadura não destruiu os valores sociais de oito séculos de história ímpar.»
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