FURACÃO BRASIL – António Braga afirma não conhecer os detidos
O empresário em causa é um dos grandes financiadores do PS no Brasil, tendo alegadamente pago a campanha eleitoral do candidato Aníbal Araújo (candidato do PS fora da Europa) nas últimas eleições de 2005
"Não conheço nenhum dos protagonistas nem nunca tive nenhuma relação a qualquer nível com as pessoas referidas, por isso não tem nenhum sentido a notícia do Expresso". - Foi nestes termos que o Secretário de Estado das Comunidades, António Braga se demarcou das notícias vindas a público e que de certa forma o relacionam com o caso.
Recorde-se que António Braga há um ano atrás nomeou Cônsul Honorário em Cabo Frio (Brasil) um empresário português agora detido no Rio de Janeiro e que alegadamente pertenceria a uma rede que comprava facilidades judiciais e políticas para investimentos na área do jogo. O referido empresário não chegaria contudo a assumir funções porque a sua nomeação foi travada pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros português, como esta semana referiu o Ministro da Presidência, Pedro Silva Pereira.
Portugueses presos no Rio citam ligação com António Braga O secretário de Estado das Comunidades portuguesas membro do governo de José Sócrates
O secretário de Estado das Comunidades, António Braga, foi citado por um dos empresários portugueses detidos no Rio de Janeiro, no âmbito da ‘Operação Furacão, que desmantelou uma rede de branqueamento de capitais, conforme anunciou o “Expresso on-line”. Fonte da secretaria de Estado disse que António Braga conhecia Licínio Soares Bastos (um dos detidos) de quem tinha as “melhores referências”.
Jaime Garcia Dias, advogado e um dos detidos pela Polícia Federal (PF) brasileira no caso da "máfia das sentenças", foi escutado a conversar com o pai, dizendo a este que o secretário António Braga poderia ser um contacto para desembargar uma obra em Portugal.
Na conversa, que consta do relatório da PF a que o jornal “Expresso” teve acesso, foi feita uma referência a um presidente de câmara socialista da região de Braga. No processo foram detidos dois portugueses: Laurentino Santos e Licínio Soares Bastos, nomeado, em 2006, Cônsul Honorário em Cabo Frio (onde reside um número insignificante de portugueses, não justificando a implementação de serviços diplomáticos).
O Jornal “Público” divulgou em 5 de Maio que o PSD deve exigir esclarecimentos por parte do PS “com urgência”, sobre as ligações dos socialistas aos detidos no Rio. O grupo é acusado de, a partir do Brasil, negociar sentenças judiciais e decisões políticas para beneficiar casas de bingo e de máquinas de jogos de azar.
Segundo as investigações, o português Licínio Soares Bastos, é um dos maiores financiadores do PS no Brasil e suportou grande parte das despesas da campanha do candidato socialista ao círculo fora da Europa nas legislativas de 2005, Aníbal Araújo.
Licínio é também proprietário do imóvel onde está instalada a sede do PS na Barra da Tijuca (RJ). O empresário viria a ser nomeado cônsul honorário de Portugal em Cabo Frio, um ano depois de José Sócrates chegar ao poder, mas o processo nunca chegou a ser formalizado junto do Ministério das Relações Exteriores do Brasil.
A Polícia Federal (PF) brasileira suspeita que o português fosse o intermediário do grupo nas negociações para abrir casinos em Portugal e no Brasil. Numa das escutas anexadas ao processo, outro detido, o advogado e empresário Jaime Garcia Dias, admitia ao vice-presidente da Associação dos Bingos do Rio de Janeiro, José Renato Granado, que estava em Portugal reunido com deputados e que as despesas da estadia estavam a ser suportadas “pelo presidente da câmara”. Na transcrição da escuta, o empresário brasileiro nunca revelava o nome ou o partido dos deputados e do autarca.
José Cesário, deputado do PSD e antigo secretário de Estado das Comunidades, disse que o PS e o Governo têm de “clarificar esta situação com urgência”, referindo que é o nome de Portugal e das comunidades portuguesas “que está em risco”.
Licínio Soares Bastos é natural de Oliveira de Azeméis, de onde é também oriundo o candidato do PS ao círculo de fora da Europa em 2005, Aníbal Araújo. O primeiro é fundador de alguns dos jornais administrados por Aníbal Araújo. “É um benemérito que muito ajuda a comunidade portuguesa, não há qualquer promiscuidade”, enfatiza Araújo.
Antes das legislativas de 2005, a confusão instalou-se na secção do PS no Rio de Janeiro, sem se saber quem dirigia esta estrutura. Terá sido por essa altura que se tornaram públicas as relações entre Aníbal Araújo e Licínio Bastos - alguns elementos do PS defendem que o empresário brasileiro impôs o nome do futuro candidato. “Foi então que o Sr. Licínio disse que foi contactado pela direcção do PS para ajudar o partido. Aí, criou a sede e pagou a campanha de Aníbal Araújo”, disse ao jornal “PÚBLICO” Eduardo Neves Moreira, ex-deputado do PSD para o círculo fora da Europa e residente no Rio de Janeiro.
A ostentação da campanha motivou uma queixa do PSD à Comissão Nacional de Eleições, apresentada a 20 de Abril de 2005. “Utilizaram aviões, cartazes em autocarros [ônibus], programas de rádio e televisão aqui no Brasil. É óbvio quem suportou tudo isso”, expõe o social-democrata. “Eu desconheço se o Sr. Licínio, de quem sou amigo, financiou ou não a minha campanha”, contrapôs Aníbal Araújo.
O deputado José Lello, antigo secretário de Estado e responsável pela área das Comunidades Portuguesas do PS, também alega desconhecer a origem do financiamento. “Isso é da responsabilidade do candidato. Conheci Licínio Soares Bastos durante essa campanha, foi-me apresentado por Aníbal Araújo. Não sei se foi ele o financiador”, afirmou, argumentando também ignorar que a sede do PS no Rio funciona em instalações do empresário agora detido.
O actual responsável pelo departamento de Relações Internacionais e Comunidades Portuguesas do PS, Luís Pisco, admite e desvaloriza o fato de a sede do PS no Rio de Janeiro estar instalada numa propriedade de Licínio Bastos. “É normal isso acontecer, ele quis ajudar o partido. Posso garantir que as reuniões políticas do partido se realizam noutro lugar”, frisou. Pisco não soube, no entanto, identificar os actuais dirigentes socialistas no Rio de Janeiro.
Colocando a tónica na sede do partido e na “generosidade” do empresário agora detido, o social-democrata Eduardo Moreira recorda conversas antigas. “Eu não sei se há promiscuidade ou não, sei é que o Sr. Licínio dizia que o apoio ao PS lhe renderia contrapartidas comerciais em Portugal”, sublinhou.
Um ano depois de o PS chegar ao poder, Licínio Soares Santos foi nomeado cônsul honorário de Portugal em Cabo Frio, a 150 quilómetros do Rio de Janeiro. A nomeação, despachada pelo secretário de Estado das Comunidades, António Braga, foi publicada no Diário da República dia 16 de Maio de 2006, mas foi suspensa meses depois quando se constatou que Licínio Bastos vinha sendo investigado pelas autoridades brasileiras. A secretaria de Estado justificou a suspensão pela disponibilidade manifestada por Licínio Bastos para suportar todas as despesas do posto consular. “O Estado português não teria qualquer despesa com esse consulado, Licínio Bastos ofereceu-se para suportar todo o investimento para ajudar a comunidade portuguesa, ele é um benemérito e até ser condenado merece a presunção de inocência”, explicou ao “PÚBLICO” Eduardo Saraiva, assessor de imprensa do secretário de Estado das Comunidades, António Braga. Um argumento que não colhe, pelo menos junto de Eduardo Moreira, que também já presidiu o Conselho das Comunidades Portuguesas no Rio de Janeiro. “Em Cabo Frio residem no máximo 20 portugueses, não faz sentido abrir aí um consulado e encerrar o de Santos, onde habitam cerca de 15 mil pessoas [na verdade passam de 30 mil] com ligações a Portugal”, disse.
Na Bahia, a jornalista Eulália Moreno lembrou que o jornal “O Globo”, do Rio de Janeiro, fez questão de referir que ambos os acusados [Laurentino e Licínio], eram financiadores do Partido Socialista no Brasil, no entanto o secretário nada sabe. “E o ‘Braguinha’ também não sabe que está com a sua presença prestigiando um encontro da dita Imprensa Regional organizado pelo ‘medalhudo’ Aníbal Araújo, de Oliveira de Azeméis, a mesma terra dos detidos? E ele também não sabe que aqui em Salvador os jornalistas idóneos presentes estão cansados de saber que este encontro foi patrocinado pelos manos, hoje detidos?”, interpela a jornalista.
Eulália ainda garantiu que o “Expresso” está vasculhando mais informações e completa: “o José Cesário que não se fique a rir porque a hora dele também está chegando”. “E por onde andará o Eduardo [?], o director do Primeiro de Janeiro que era o que mais se governava com a imprensa dita regional já que nas gráficas de sua propriedade eram impressos milhares de jornalecos folha de couve e paroquiais que se governavam com o ‘porte pago’ forjando tiragens que nunca tiveram? Esse era do PSD, mas transitava por todos os partidos. Até conseguiu um terreno magnífico na Boa Vista, da cidade do Porto, alegando que ali seria construída a sede do Primeiro de Janeiro, o jornaleco que nunca pagou aos seus profissionais da informação”, denuncia Eulália.
Ainda de Salvador, Eulália disse ter-se encontrado com várias “personalidades” e, segundo ela, a maioria delas com ar de “não me comprometa”. A jornalista diz ainda que, “em declarações ao jornalista da Lusa que também está aqui à custa do contribuinte português, o secretário das Comunidades, António Braga, à boa maneira do que se diz no Minho, de onde é originário, ‘fugiu com o rabo à seringa quando foi interpelado acerca do processo da ‘Máfia das Sentenças. Ai, ai, ai que isto ainda vai parar no escândalo do ‘BragaParques’, passando pelos financiadores do Partido Socialista no Brasil, os manos Licínio e Laurentino que se encontram devidamente encarcerados no Rio de Janeiro acusados de envolvimento nos negócios dos bingos”. E encerra seu comentário com ironia: “Abraço, do Congresso Faz de Conta da UNIR, em São Salvador, Bahia, Eulália Moreno”.
A Agência Lusa por sua vez publicou em 4 de Maio que o secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, António Braga, “não conhece” os portugueses supostamente envolvidos no esquema de venda de sentenças judiciais desbaratado pela Polícia Federal na Operação Hurricane. Segundo a Lusa, Braga assegurou não ter “qualquer relação” com as acusações que são feitas pelo semanário português “Expresso”.
“Não conheço nenhum desses protagonistas. Nunca tive nenhuma relação, a qualquer nível, com as referências que são feitas. Portanto, fico deveras admirado”, disse à Agência Lusa António Braga, que se encontra em visita ao Brasil, em Salvador.
O secretário, um dos três vice – ministros das Relações Exteriores de Portugal, ressaltou que a notícia da versão on-line do Expresso “não tem nenhum sentido”, acrescentando que já fez as mesmas declarações ao próprio Expresso. A Operação Hurricane, deflagrada no último dia 13, levou à prisão vários juízes, advogados e empresários, entre os quais os portugueses Licínio Bastos e Laurentino dos Santos, pelos motivos já expostos.